13 de mai. de 2016

VULTOS MARANHENSES - REGINALDO FORTUNA


Reginaldo Fortuna
Por Natan Castro

"Estou convencido de que a charge num jornal tem o mesmo peso que um editorial; ela não pode cair na vala comum da ilustração. Quem desenha na página nobre trabalha fundamentalmente com opinião, de uma maneira muito particular: a charge é mais direta que o texto. Nela, as acrobacias de estilo, em que tudo que é dito numa frase comporia um 'mas, porém, contudo, todavia' no parágrafo não tem lugar."

Reginaldo José de Azevedo Fortuna é o autor das palavras acima. O grande chargista conhecido no meio como Reginaldo Fortuna é maranhense de São Luís (MA). Tido por muitos como um dos maiores chargistas do Brasil, Reginaldo Fortuna é contemporâneo de grandes nomes como Millôr Fernandes, Ziraldo, Jaguar, Borjalo, com alguns deles inclusive foi fundou o lendário O Pasquim.

Fortuna sempre foi reconhecido pelo seu profundo perfeccionismo que se percebia por detrás de um traço inconfundível. Detentor de uma personalidade forte o chargista é o autor do primeiro gibi brasileiro moderno “O Bicho”, possui uma sólida carreira em importantes jornais e revistas de renome nacional dentre eles Correio da Manhã, de 65 a 69, fundou o Pasquim, foi editor de arte da Enciclopédia Barsa, de Veja, diretor de redação de Cláudia, criou com Tarso de Castro o Folhetim, na Folha de S.Paulo, onde também foi chargista.

Reginaldo Fortuna morreu no ano de 1994 vitima de um fulminante ataque cardíaco.

O grande Millôr Fernandes sobre Reginaldo Fortuna

Charge do Fortuna

Encarcerado entre o ontem e o amanhã, na prisão perpétua do presente, Fortuna ri. Olhe-se daquele lado e se percebe que ele pode ser tudo menos um bípede implume. Mas mudando de calçada vê-se imediatamente que é um filho prodígio que nunca fugiu de casa. Anda sempre com cara de poucos amigos, mas tem muitos. Sobretudo uns. De vez em quando se atira do décimo andar onde mora, porque, humorista nato, recusa-se a aceitar a lei da gravidade. Apenas, por precaução, se atira para dentro. Tem o mesmo nome da deusa de Famagusta mas a ele no le gusta. Isso porque da cornucópia da deusa saía muito dinheiro e, no Brasil, de cornucópia nem é bom falar. Abstêmio, se abstém sobretudo de não beber. Moralista, acha que, no fundo, toda mulher é nua. Poeta, é dos que conquistam uma mulher para justificar a compra de meia dúzia de rosas. Radical, acha a mulher muito superior ao homem, o que, segundo o Bornay, é uma superstição como outra qualquer.

Tem trinta e poucos anos de altura, um metro e sessenta e tantos de jornalismo profissional, e não brinca com crianças porque quem brinca com crianças amanhece assassinado. Analista profundo, jamais caiu na rotina embora tenha caído em inúmeras arapucas. É contra qualquer discriminação mas a que mais o irrita é a da companhia telefônica, que só põe no catálogo gente que tem telefone. Quando a gente quer telefonar prum amigo que não tem telefone, o nome dele nem está lá. Vai ficar rico em 1970, mas ainda não sabe. Pelo contrário, de vez em quando, para pânico nosso, diz que, como Tarzã, pretende mudar de ramo.

Fortuna tem, em suma, a personalidade dele mesmo, riso hipotético, traço desconfiado e só anda onde não deve. Onde deve não o deixam entrar. Exageradamente tímido, certo dia, descobrindo um ladrão embaixo da cama, chamou a polícia, mas deu o número do apartamento ao lado, para evitar o escândalo. Define o humorista como um homem que foi buscar tôs e saiu lãquiado, acha que o adultério só é um pecado mortal se o marido estiver armado, diz que em matéria de América cada um tem os Estados Unidos que merece e é tarado por coisas que destesta.


Perfeicionista nato, fica tão irritado quando alguém confunde um Steinberg da primeira fase com um Einstein post-mortem como um técnico de cactos quando alguém confunde uma Opuntia com uma Pereskia. Entre suas descobertas mais importantes estão o furo da rosca, o oco exterior e a moeda sem coroa. Atualmente está pesquisando o som de uma mão batendo palmas. Enfim, o grande mal do Fortuna é que todo mundo o leva a sério. Nunca foi tratado com a hilaridade que merece. (Millôr Fernandes)

2 comentários:

  1. Acompanhei vários anos seu trabalho. Descobri-o no Pasquim, mas acho que talvez tenha sido antes. Na Revista O Cruzeiro? Será? Não importa.Importa é o seu trabalho, culto e refinado. Mais um maranhense universal.

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