Reginaldo Fortuna |
Por Natan
Castro
"Estou convencido de que a charge num jornal
tem o mesmo peso que um editorial; ela não pode cair na vala comum da
ilustração. Quem desenha na página nobre trabalha fundamentalmente com opinião,
de uma maneira muito particular: a charge é mais direta que o texto. Nela, as
acrobacias de estilo, em que tudo que é dito numa frase comporia um 'mas,
porém, contudo, todavia' no parágrafo não tem lugar."
Reginaldo José
de Azevedo Fortuna é o autor das palavras acima. O grande chargista conhecido
no meio como Reginaldo Fortuna é maranhense de São Luís (MA). Tido por muitos
como um dos maiores chargistas do Brasil, Reginaldo Fortuna é contemporâneo de
grandes nomes como Millôr Fernandes, Ziraldo, Jaguar, Borjalo, com alguns deles
inclusive foi fundou o lendário O Pasquim.
Fortuna sempre
foi reconhecido pelo seu profundo perfeccionismo que se percebia por detrás de
um traço inconfundível. Detentor de uma personalidade forte o chargista é o
autor do primeiro gibi brasileiro moderno “O Bicho”, possui uma sólida carreira
em importantes jornais e revistas de renome nacional dentre eles Correio da
Manhã, de 65 a 69, fundou o Pasquim, foi editor de arte da Enciclopédia Barsa,
de Veja, diretor de redação de Cláudia, criou com Tarso
de Castro o Folhetim, na Folha de S.Paulo, onde também foi chargista.
Reginaldo
Fortuna morreu no ano de 1994 vitima de um fulminante ataque cardíaco.
O grande Millôr Fernandes sobre Reginaldo Fortuna
Charge do Fortuna |
Encarcerado entre o ontem e o amanhã, na prisão
perpétua do presente, Fortuna ri. Olhe-se daquele lado e se percebe que ele
pode ser tudo menos um bípede implume. Mas mudando de calçada vê-se
imediatamente que é um filho prodígio que nunca fugiu de casa. Anda sempre com
cara de poucos amigos, mas tem muitos. Sobretudo uns. De vez em quando se atira
do décimo andar onde mora, porque, humorista nato, recusa-se a aceitar a lei da
gravidade. Apenas, por precaução, se atira para dentro. Tem o mesmo nome da
deusa de Famagusta mas a ele no le gusta. Isso porque da cornucópia da deusa
saía muito dinheiro e, no Brasil, de cornucópia nem é bom falar. Abstêmio, se
abstém sobretudo de não beber. Moralista, acha que, no fundo, toda mulher é
nua. Poeta, é dos que conquistam uma mulher para justificar a compra de meia
dúzia de rosas. Radical, acha a mulher muito superior ao homem, o que, segundo
o Bornay, é uma superstição como outra qualquer.
Tem trinta e poucos anos de altura, um metro e
sessenta e tantos de jornalismo profissional, e não brinca com crianças porque
quem brinca com crianças amanhece assassinado. Analista profundo, jamais caiu
na rotina embora tenha caído em inúmeras arapucas. É contra qualquer
discriminação mas a que mais o irrita é a da companhia telefônica, que só põe
no catálogo gente que tem telefone. Quando a gente quer telefonar prum amigo
que não tem telefone, o nome dele nem está lá. Vai ficar rico em 1970, mas
ainda não sabe. Pelo contrário, de vez em quando, para pânico nosso, diz que,
como Tarzã, pretende mudar de ramo.
Fortuna tem, em suma, a personalidade dele
mesmo, riso hipotético, traço desconfiado e só anda onde não deve. Onde deve
não o deixam entrar. Exageradamente tímido, certo dia, descobrindo um ladrão
embaixo da cama, chamou a polícia, mas deu o número do apartamento ao lado, para
evitar o escândalo. Define o humorista como um homem que foi buscar tôs e saiu
lãquiado, acha que o adultério só é um pecado mortal se o marido estiver
armado, diz que em matéria de América cada um tem os Estados Unidos que merece
e é tarado por coisas que destesta.
Perfeicionista nato, fica tão irritado quando
alguém confunde um Steinberg da primeira fase com um Einstein post-mortem como
um técnico de cactos quando alguém confunde uma Opuntia com uma Pereskia. Entre
suas descobertas mais importantes estão o furo da rosca, o oco exterior e a
moeda sem coroa. Atualmente está pesquisando o som de uma mão batendo palmas.
Enfim, o grande mal do Fortuna é que todo mundo o leva a sério. Nunca foi
tratado com a hilaridade que merece. (Millôr Fernandes)
Acompanhei vários anos seu trabalho. Descobri-o no Pasquim, mas acho que talvez tenha sido antes. Na Revista O Cruzeiro? Será? Não importa.Importa é o seu trabalho, culto e refinado. Mais um maranhense universal.
ResponderExcluirSem dúvidas poeta!
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