A coluna QUARTA É
DIA DE RF do nosso blog Literatura Limite (literaturalimite.blogspot.com.br) traz
um novo episódio das CRÔNICAS DO PUCUMÃ, uma série de postagens para todos que
se interessam pela leitura, pela história e pelo conhecimento, em forma de
crônicas, relatos e entrevistas acerca dos acontecimentos que se relacionam com
a História do Município de São Domingos do Maranhão, conhecido, principalmente
desde o seu descobrimento até a década de 60, como São Domingos do Zé Feio.
Hoje apresentamos as eleições de 1955 para o
Governo do Maranhão, e pela quantidade de lutas, refregas e escaramuças nas
quais se digladiaram os candidatos governistas, liderados por Vitorino Freire e
e os candidatos das Oposições Coligadas, de homens como Neiva Moreira, Clodomir
Millet entre outros, podemos entender que o que acontecia nos municípios era
apenas um reflexo da politicagem que reinava no Estado.
O MARANHÃO DE
VITORINO
A fraude campeava de norte a sul e de leste a
oeste, os juízes eram comprados ou subservientes, cartórios serviam para a
expedição de registros de nascimento, títulos de eleitor e falsificação de
documentos de toda a sorte que visasse aumentar os currais eleitorais,
promotores e advogados se dedicavam ao serviço sujo de negociatas e
bandalheiras, tudo sob o beneplácito de Vitorino Freire e dos maiorais do PSD,
agindo sob manto protetor do Palácio dos Leões.
Mas não eram só as forças
do governo que agiam assim. Também as Oposições não ficavam atrás. Um dos
cabeças era o grande líder oposicionista do PSP, senador Clodomir Millet.
Nos municípios em que contavam com o apoio de
prefeitos e lideranças municipais a prática política e eleitoral exercida pelos
líderes oposicionistas em nada ficavam a dever às hostes governamentais:
juízes, cartórios, advogados e promotores usavam e abusavam das mesmas fraudes
e práticas criminosas que o vitorinismo instalara no Maranhão, como forma de
atingir o poder, pois só isso lhes importava. Muita gente ainda hoje sente
saudades de uma época em que até os mortos votavam...
Os anos de 1955 e 1956
ilustram muito bem o que até aqui dissemos. Vamos acompanhar um pouco das
escaramuças, os vai-e-vem da política maranhense durante as eleições de 1955,
quando os eleitores deveriam eleger o novo Presidente da República, e o
Maranhão deveria eleger seu novo governador, cujos principais candidatos eram o
senhor Mattos Carvalho pelo PSD de Vitorino Freire, com o apoio do governador
Eugênio Barros, e pelas Oposições Coligadas (PSP-UDN e outros partidos menores)
o candidato era o senhor Cunha Machado, com o apoio de Clodomir Millet e demais
lideranças que se opunham ferozmente a que o senador Vitorino Freire continuasse
mandando na política do Estado do Maranhão.
Também em 1955, São
Domingos do Maranhão deveria eleger pela primeira vez o seu Prefeito Municipal,
pois o senhor Aluízio Silva Brandão, nomeado em 1952 para exercer o seu mandato
a partir de janeiro de 1953, devia agora organizar e presidir as eleições para
a sua sucessão. A esta altura, dois grupos políticos rivais iriam se enfrentar
pela primeira vez nas urnas, numa eleição disputadíssima e que tinha como
candidato da situação o senhor Elidônio Aprígio do Nascimento e representando a
oposição o senhor Jofran Carneiro Torres.
AS ELEIÇÕES DE 1955
O PSD maranhense, além do
cacique Vitorino Freire, era uma espécie de saco de gatos, tipo esse o PMBD de
agora. E depois de idas e vindas, marchas e contramarchas, conseguiu realizar
sua convenção, saindo vitorioso o senhor Mattos Carvalho, apresentado pela
facção que deseja um candidato da cidade de São Luís, e não do interior como
tinham sido Sebastião Archer e Eugênio Barros. Queriam retirar do partido a
pecha de partido coronelista, e exibir uma face mais moderna e mais humanizada.
Por isso Mattos Carvalho
vinha a calhar para tal papel: médico da cidade com penetração nas camadas das
classes médias e pobres da população, residia no Anil e trabalhava na Companhia
de Tecidos Rio Anil, e tinha ainda a seu favor o fato de ser Secretário de
Saúde, com relevantes serviços prestados à coletividade.
Para vice governador foi indicado o Secretário do
Interior e Justiça e Segurança, senhor Alexandre Costa, cunhado do governador
Eugênio Barros, mas sua candidatura não agradou a diversos e expressivos
líderes da situação.
No dia 30 de julho de 1955, com a presença dos
candidatos a Presidente e Vice-Presidente da República, senhores Juscelino
Kubitschek e João Goulart, frutos da aliança PSD/PTB, realizou-se a convenção
solene e festiva, no Teatro Arthur Azevedo, para apresentação e homologação das
candidaturas a Governador e Vice Governador dos senhores Mattos Carvalho e
Alexandre Costa, respectivamente.
Mesmo antes da convenção, a dissidência no PSD só
aumentou e seu recrudescimento veio por fim à pretensa união partidária,
formando-se uma corrente dissidente encabeçada pelo deputado Cunha Machado que
declarou-se, então, disposto a concorrer também ao Governo do Estado, embora
não dissesse na ocasião por qual partido participaria da disputa eleitoral. Ele
e seus aliados não concordavam com a candidatura de Mattos Carvalho, bancada e
monitorada pelo grupo chefiado pelo deputado Newton Bello, vitorinista, com o
qual os dissidentes não se alinhavam.
Era o que as Oposições esperavam. Juntamente com os
dissidentes do PSD articularam imediatamente o lançamento da candidatura do
brigadeiro Cunha Machado ao Governo do Estado. O candidato a vice governador
foram buscar no PSP: o coronel do exército Alexandre Sá Collares Moreira, um
ex-vitorinista e oficial bastante respeitado e prestigiado por sua idoneidade
moral.
Durante essa grande campanha política pelo governo
do Maranhão e visando angariar votos e formar alianças todos os candidatos à
presidência da República, sem exceção, também visitaram o Estado com suas
comitivas e apoiadores.
Primeiro, veio Juscelino e seu vice João
Goulart que se dirigiu em cortejo, na
verdade o que hoje se chama de carreata, até a Praça João Lisboa onde falaram
ao povo. Em seguida, participaram de
comícios em São José de Ribamar e no Bairro do João Paulo.
Depois foi a vez do candidato militar Juarez
Távora, que estivera antes na cidade de Carolina. Desembarcando no aeroporto do
Tirirical, dali seguiu direto até o Teatro Arthur Azevedo onde houve uma
solenidade e após visitar a Faculdade de Direito, a Igreja do Carmo e o Comitê
Central das Oposições Coligadas (UDN, PSP, PDC, PR, PTN e PRP), visitou também
o Governador Eugênio Barros, tendo prosseguido viagem de campanha para outros
estados.
Plínio Salgado, líder integralista filiado ao PRP,
foi o terceiro candidato presidencial a visitar o Estado do Maranhão, tendo
participado de uma concentração popular na Praça João Lisboa, tendo falado ao
povo ali reunido.
E por último, chegou o grande líder oposicionista
ao governo federal o doutor Ademar de Barros, do PSP, cercado de grande
aceitação e simpatia popular, e acompanhado de uma grande multidão tomou rumo
da Praça João Lisboa, local das grandes concentrações políticas, em numerosa
carreata. Próximo ao Monte Castelo, desceu do carro e foi a pé até o centro da
cidade onde se realizou um grande e animado comício. Depois visitou, ainda, as
cidades de Caxias, Codó, São Bento, Matinha, Penalva, Cajari, Viana e
Anajatuba.
A campanha ganha as ruas, na Capital e no Interior
do Maranhão, e enquanto as lideranças se desdobravam no corpo a corpo, nos
comícios, na compra de votos, nas formas lícitas e ilícitas de se conquistar a
vitória, os advogados de ambas as partes, tanto do Governo, quanto da Oposição,
abarrotavam os Tribunais, tanto o Regional quanto o Superior Eleitoral, com toda a sorte
de querelas, chicanas, arrazoados, mandados disso e daquilo.
Foi feita uma representação para anular a
candidatura de Alexandre Costa ao cargo de vice governador, pelo fato do mesmo
ser cunhado do então governador Eugênio Barros, e após a sentença do TER, o
processo foi parar no Superior Tribunal Eleitoral, cuja sede era no Rio de
Janeiro.
E essas eleições traziam uma novidade em relação às
últimas eleições: as famigeradas chapinhas que o eleitor tinha o trabalho de
apenas colocar dentro das urnas, muitas vezes sem saber em quem votava, seriam
substituídas pela cédula oficial, uma conquista democrática de grande alcance
popular, nascida do desejo de se diminuir a fraude eleitoral.
Convém lembrar que o PSD fez todo o possível para
que tal mudança não fosse aprovada pelo Congresso Nacional, pois sendo
majoritário nas zonas rurais preferia as tais chapinhas que lhe eram
favoráveis. Mas uma campanha nacional organizada e divulgada pela UDN resultou
na aprovação da nova cédula oficial pelo membros do Congresso Nacional.
Muito embora as tropas federais, principalmente do
Exército, estivessem espalhadas pelos quatro cantos do Estado, as eleições se
realizaram como sempre: cheias de fraudes, irregularidades e ao arrepio da
legislação vigente. Em muitos lugares, a lei era do mais forte, ninguém
respeitava nem lei e nem mesários, os caciques municipais mandavam e
desmandavam.
Até invasão dos locais onde as urnas estavam sendo
guardadas e vigiadas eram invadidos, urnas sumiam e reapareciam cheias de votos
favoráveis aos candidatos dos interessados que praticavam tais absurdos, quase
sempre acompanhados por guarda-costas armados até os dentes.
Realizadas as eleições e apurados os votos, o
Tribunal Regional Eleitoral, somente no dia 26 de janeiro de 1956, a cinco dias
da posse, reúne-se e convoca a imprensa para apresentar o resultado do pleito,
que foi o seguinte: Coligação PSD-PTB-PL, cujo candidatos eram Mattos Carvalho, 79.416 e Alexandre Costa,
para vice com 76.804 votos. As Oposições Coligadas PSP-UDN-PDC-PR-PTN-PRP teve
os seguintes votos: Cunha Machado, 69.920 e o vice Collares Moreira, 68.826
votos.
Proclamados eleitos Governador e Vice os senhores
Mattos Carvalho e Alexandre Costa, a posse seria outra novela que duraria quase
todo o ano de 1956 entre o assume e não assume, devido o excesso de
representações, impugnações, mandados de segurança impetrados pelos advogados
das Oposições Coligadas que não aceitavam, sob hipótese nenhuma, o resultado
das eleições que eles diziam ilegítimas e ilegais devido o grande número de
fraudes e desrespeito à legislação eleitoral em vigor.
Para encerrar, basta dizer que no dia 31 de janeiro
de 1956 quem assume não é o governador eleito, senhor Mattos Carvalho, e sim o
deputado Alderico Machado, na condição de presidente da Assembléia Legislativa,
em substituição ao governador Eugênio Barros. E depois, mais um interino assume
o governo do Estado, o deputado Eurico Ribeiro que ali ficaria até as decisões
finais dos Tribunais que viessem por um fim àquela luta que envergonhava o
Maranhão perante o resto do Brasil.
Até tentativa de invasão do Palácio dos Leões foi
colocada em marcha, sob a chefia do Capitão Godim, mas cujo resultado foi
frustrante e não prosperou. Assim, só no
dia 8 de julho de 1957, após prestar compromisso de posse na Assembléia
Legislativa, marcada para as 17 horas e que transcorreu dentro da normalidade,
o Governador Mattos Carvalho pode, enfim, às 18 horas adentrar o Palácio dos
Leões, como novo chefe do Governo Maranhense. Quase um ano e oito meses depois
de sua eleição. Era assim, o Maranhão de Vitorino Freire. Só do Vitorino
Freire?
Raimundo Fontenele
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