Eu
estava numa casa comercial, localizada na Avenida do Estado, para fazer o Censo, e a dona do estabelecimento me
perguntara secamente: “O que foi?”
Expliquei que eu era funcionário do
IBGE, e que estava ali para que ela me respondesse um questionário, era coisa
necessária para o Governo poder fazer seus planos de desenvolvimento e tal. Ela
disse ali, na lata, que não ia responder coisa alguma. Por ocasião de
apresentar-me a ela, fiquei sabendo o seu nome: Antonella, aí falei, tranqüilo,
explicando devagar, mas com determinação pra ela saber que eu também não estava
brincando.
–
Dona Antonella, é o seguinte: eu não posso sair daqui sem este questionário
respondido pela senhora. – E agitei o formulário em sua frente para que ela
visse bem, passei as folhas, eram quatro páginas, letrinhas pequenas, tinha
pergunta que não acabava mais.
E expliquei de novo que mesmo ela
sendo italiana, mas tinha que responder e eu, inclusive, tinha autorização até
pra chamar a polícia se a pessoa se recusasse a responder. Notei que quando
falei em polícia ela pareceu tomar um susto, mas recompondo-se disse que tudo
bem, vamos lá, ela ia responder.
E comecei o, bem, o interrogatório.
Pelo menos para ela era esse o caráter daquelas perguntas invasivas e sem fim.
Assim ficamos num lenga-lenga por quase 4 horas. Perdi praticamente a tarde toda
com aquela dona Antonella, uma pessoa de maus bofes, mal educada e turrona.
Lembro que, a certa altura, quando lhe perguntei se o seu fogão era a gás ou
lenha, ela raivosamente me perguntou se eu e o governo queríamos também saber o
que ela ia comer, que não devia nada nada a diabo de governo nenhum, e ia em cima
ia embaixo, e umas três vezes tivemos que interromper o Censo pra ficar
discutindo o sexo dos anjos. E três vezes ou mais tive que lhe ameaçar que ia
chamar a polícia. Nessas horas ela voltava a si e continuava respondendo.
No quesito propriedade, imóveis ela
declarou-me só possuir aquela casa de dois pavimentos, uma casa grande, embaixo
era o comércio e em cima sua residência. Com ela moravam dois netos, um casal
de jovens, estudantes, que lhe faziam companhia, mas dormiam na casas de seus
pais. Ela ficava sozinha à noite. Só possuía aquele imóvel e aquele
comércio.
Depois de me deixar quase fora do
sério, conseguimos encerrar o assunto e dei boa tarde e me fui indo. Em frente
com o Censo, compadre! Logo logo eu ia descobrir que aquela velha rabugenta era
uma tremenda vigarista, avarenta e exploradora de uma porção de pobres, gente
miserável mesmo, que alugava uns barracos de sua propriedade, cujas informações
ela havia sonegado numa boa. Eu voltaria lá, ora se voltaria. (continua)
Raimundo
Fontenele
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