3 de mai. de 2016

O POETA MARANHÃO SOBRINHO NÃO TAVA NEM AÍ PRAQUELA JOSTA


              Andei pensando umas coisas malucas. De achar que no Maranhão, principalmente em São Luís, a nossa história literária é toda cheia de falhas, de vaidades, de inveja e de mentiras. E ela andou, anda ainda, aos pulos, como um sapo. Vários grupos, panelas, corporações de homens de letras se juntam, dão ideias, criam, escrevem, divulgam, e aí, cataplimba!, tudo volta ao silêncio.
            Só muito tarde falaram de Sousândrade. Só agora se publica trabalhos sobre Maranhão Sobrinho.  Os da Atenas Brasileira, os dos Novos Atenienses, os da Academia Maranhense de Letras, os da Academia dos Novos, cada um no seu tempo e lugar marcaram suas presenças, mas é como se fossem estanques e não se retroalimentassem uns aos e dos outros. São muitos grupelhos, e ao longo, do tempo, não se sistematizou todos esses grupos, retirando de cada um deles as figuras mais representativas, e se fosse reunindo-os e publicando-os numa espécie de Suma Maranhensis da Literatura.
            E na história recente isto é mais evidente. Cada grupo só vê o próprio umbigo. Não existe um órgão de estado que fomente a cultura, que reedite constantemente as diversas obras e seus autores, que estimule a pesquisa num campo amplo e vasto. Se alguém aí se levantar e disser, com a boca cheia e o peito inflado, “nós temos um órgão importante, a Secretaria de Cultura”, ora, eu sou capaz de mandá-lo enfiar o tal órgão naquele lugar.
Porque aí quem disser isso vai estar de sacanagem comigo. Todos sabem, mas colocam uma venda nos olhos pra fazer de conta que não estão vendo nada, que a Secretaria de Cultura há muito se tornou um cabide de emprego, um porto seguro para os artistas ancorarem suas produções cheias de salamaleques e peidos, mas que a nada questionam, nada enfrentam, nada quebram, nada inovam. São artífices usados e abusados pelos governantes de plantão a quem aplaudem e puxam o saco até arrancar. Como deve ter governante roncolho no Maranhão de hoje!
            A Secretaria de Cultura nada mais é que uma produtora de eventos festivos. Fomentadora de cultura, o caralho! É da mesma gênese desta tal porra de Pátria Educadora. Faltam produções literárias específicas, antologias de poesia e prosa, de caráter didático, para distribuição em bibliotecas escolares, sintetizando quatrocentos anos de história literária, em vários tomos, mas o dinheiro é pra encher o bolso dos cupinchas governamentais e pra comprar capim pros bois. “Farta” tudo (Raimundo Fontenele).

Sobre o homenageado:
José Américo Augusto Olímpio Cavalcante dos Albuquerques MARANHÃO SOBRINHO, nascido em Barra do Corda-MA, a 30 de dezembro de 1879 e falecido em Manaus no dia 25 de dezembro de 1915, se constitui num dos maiores poetas brasileiros, legítimo representante do Simbolismo. Vida desregrada e boêmia, faleceu muito cedo, com a idade de apenas 36 anos, o que não era incomum tratando-se de artistas e poetas, todos vítimas do mal do século: muita farra, mulheres, doenças venéreas e falta de antibióticos. Sua obra poética se resume a Papéis Velhos... Roídos pela Traça do Símbolo (1908), Estatuetas (1909) e Vitórias Régias (1911).
Nesta primeira homenagem mensal, seguem-se: um primoroso ensaio crítico, que iremos trazendo aos poucos, durante este mês, aguçando o apetite dos amantes da boa literatura. O trabalho é da professora Vanda Maria Sousa Rocha, com graduação em Letras pela Universidade Federal do Maranhão (1993) e mestrado em Ciências da Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2001). E, claro, alguns poemas do nosso homenageado (RF).


 A MEMÓRIA NA POESIA DE MARANHÃO SOBRINHO
                      Vanda Maria Sousa Rocha

1. INTRODUÇÃO

Este estudo se constitui numa investigação sobre o memorialismo poético, subjacente em Papéis Velhos, Rosa Morta e Evocação, sonetos circunscritos na obra Papéis Velhos, de José Américo dos Albuquerques Maranhão Sobrinho, poeta maranhense, situado nos entres séculos XIX e XX. Considerando que toda poesia já contém em sua essência, uma teoria, a presente reflexão será guiada por um olhar transdisciplinar, instaurando diálogos possíveis, a partir de algumas orientações de Bérgson e Proust sobre Tempo e Memória, particularizando questões referentes à memória individual e coletiva, evitando, dessa forma, assumir, em algum grau, a inexorável postura dogmática da Ciência, por parecer insuficiente, nessa jornada marcadamente subjetiva, que aponta para a natureza ilimitada da própria memória, diluída nos vestígios imprecisos das poesias, aqui, proposta.
A razão dessa temática prende-se, também, ao desejo de conhecer a instigante vida de Maranhão Sobrinho (impossível fazê-lo, totalmente.), marcada pelas inquietações existenciais, exílio voluntário e solidão. Este é o contexto no qual se inscrevia esse homem, porque perdido no seu próprio presente, buscava indícios de mudanças via poesia, como desejo de sublimação. Não havendo estudos publicados em torno desse poeta, vislumbra-se, aqui, “lançar luzes” num passado, (de pouco registro) um tanto distante, construído por emoções imersas em turvas lembranças onde, provavelmente, serão encontrados fragmentos de sua personalidade, da obra e de seu “estar-no-mundo” - dívida merecedora de correção, por parte da Crítica Literária brasileira - para tanto, são oferecidas algumas informações, da ordem do individual e  social de Maranhão Sobrinho, vislumbradas em sua produção, ainda que incipientes, mas altamente significativas e reveladoras da natureza poética e histórica, pois, a vida coletiva, as memórias das relações sociais e dos sistemas de conhecimentos ganharam novos contornos no processo de produção de sua obra.
No capítulo IV efetiva-se a leitura de alguns sonetos, já citados, de Maranhão Sobrinho, conduzida pela orientação teórica de Bérgson e outras tendências de pensamentos, filiadas ao estudo da memória.
A consideração sobre a importância deste trabalho para o constructo teórico da pesquisadora será dito de maneira provisória, pois, conclusão no campo das subjetividades, daria um peso, no mínimo, banal a algo tão singular e tão próprio do humano: a memória de um homem.


2. REPAGINANDO TRAÇOS DA MEMÓRIA INTELECTUAL MARANHENSE

Ao final do século XIX, dois mitos tiveram uma marca significativa na constituição da cidade de São Luís e deram expressividade à cultura dos maranhenses. O primeiro, da Atenas brasileira, dando início, através da atuação de jovens intelectuais, em atividades que reforçavam a ideia de que, a fase de opulência cultural do Maranhão, deveria ser perpetuada e resguardada a todas as gerações. O segundo reporta-se à fundação de São Luís pelos franceses, instalando o discurso de uma identidade moldada nos costumes da Europa. Este último contribuiu para que o progresso intelectual posterior dos ludovicenses fosse associado e fundamentado à “ancestralidade ilustre dos franceses gentis e fidalgos” que deram origem à cidade de São Luís do Maranhão.
[...] afirmamos à França sempiterno gloriosa, que somos um povo ennobrecido pelo trabalho e engrandecido pelas letras, pelas sciencias e pelas artes e que vaidosos embora da descendência dos portuguezes, guardamos como glória a fundação da Capital pelos francezes [...] Assim, minhas Senhoras e meus Senhores, todos de pé e alma em toda mostra de alegria: - Viva o Maranhão! Viva a França! Viva o Brasil! Viva a República na França e nosso Brasil (ÁLBUM Commemorativo do 3º Centenário da Fundação da cidade de São Luís, capital do Estado do Maranhão. São Luís: Typografia Teixeira, 1913. p. 13 e 14).
O mito da Atenas Brasileira esteve vinculado à fase esplendorosa da economia, quando o Maranhão foi incorporado ao sistema mercantilista, por meio da atuação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, criada pelo Marquês de Pombal, na segunda metade do século XVIII, com o objetivo de dar reforço às atividades agroexportadoras do Norte e Nordeste, e, diante de auxílio, a Província experimentou um grande avanço econômico, possibilitando viver um período áureo, na produção de algodão e arroz.
A referida “Idade de ouro” caracterizada pela opulência econômica, originou-se devido à expansão da lavoura algodoeira e da rizicultura. Esses dois produtos promoveram ao Maranhão um estado de riqueza e de grande exportadora da Colônia, o que conseqüentemente apaziguou a imagem de pobreza e miséria que os maranhenses apresentavam. Assim, com o desempenho da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, o Maranhão começava a ganhar espaço na economia colonial e destaque nacional.
Qual outra foeniz renascida das cinzas, o Maranhão levantava sua altiva cabeça para emparelhar com as Províncias mais opulentes do Brasil. Apenas saído da gentilidade, elle não conhecia nem comercio, nem agricultura: os portos se achavão sem comunicação, os poucos effeitos da sua produção empatados; a cidade sem edifícios; os moradores dispersos, e finalmente reputado como inútil este fértil torrão [grifos nossos] (GAIOSO apud ALMEIDA, Op.cit.p. 50).

A Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão - tornou-se, então,
responsável pelas condições favoráveis ao progresso da economia maranhense, considerando ser o financiamento, alternativa primeira para compra de mão-de-obra escrava e ferramentas agrícolas. Assim sendo, a Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão enriqueceram sobremaneira, a Província e, essa expansão econômica, supostamente promoveu mudanças na vida cultural do Maranhão. Considerando que, nessa época, foram construídos em São Luis, casarões que, hoje, caracterizam o Centro Histórico da cidade. Os sobradões que compõem o Centro Histórico foram erguidos pelos agroexportadores locais daquela época, que recebiam influências européias, em diversos aspectos cultuarias: vestimentas, mobílias, educação, artigos de uso pessoal e móveis.
Notável por sua elegância e suas maneiras e por sua fineza. A riqueza do país, o desejo de imitar os costumes europeus popularizados por uma infinidade de casas francesas e inglesas [...] (MÉRIAN. (1998) Op. cit. p. 13).
O desenvolvimento produtivo maranhense contribuiu para a fomentação de sua cultura e, com o lucro da produção algodoeira, foi possível proporcionar aos filhos dos agroexportadores locais uma educação mais elitizada – eram enviados à Europa para estudarem nas universidades de Portugal, Paris e Londres. O regresso desses jovens estudiosos, juntamente com aqueles que haviam se alimentado da cultura européia, impregnada na sociedade maranhense, favoreceu mudanças na vida cultural do Maranhão.
[....] A perfeita educação, os modos delicados e suaves das mulheres do Maranhão contribuíam para fazer desta cidade um dos ligares mais agradáveis de se viver no Brasil. Em suas maiorias criadas em Portugal, as jovens senhoritas da região traziam consigo o gosto pelo trabalho e pela ordem, recato e comportamento geralmente alheio às nativas. Quanto aos rapazes, quase todos vão estudar nos melhores colégios da França ou Inglaterra (MÉRIAN. (1998) Op. cit. p. 13).
Os grandes proprietários rurais, além de fazerem altos investimentos na
educação de seus filhos, faziam também a aquisição de bens materiais que denotavam a sua riqueza e influência nos costumes europeus. No ano de 1816, com a construção do Teatro União – hoje, Teatro Arthur Azevedo – a cultura popular foi marcada por espetáculos teatrais que incentivavam os maranhenses ao modo de vida da Europa, pois, a considerada classe alta do Maranhão transfigurava a imagem dos ludovicenses, através da erudição propagada naquela época. Assim, dentro desse contexto, as atividades intelectuais ganhavam expressividade, dando origem à idéia de Atenas Brasileira. Então, nomes como os de Odorico Mendes, João Lisboa, Gonçalves Dias, Sousândrade, Humberto de Campos, Cândido Mendes e outros, construíram no Maranhão, hábitos que expandissem a vida intelectual desse Grupo Maranhense.
O espaço cultural no qual o Grupo Maranhense fazia suas atividades ficou fortemente caracterizado pela:
[...] recorrência de palestras e conferencias de várias sociedades recreativas e literárias; pela publicação intensiva de obras nativas e de outras Províncias; pelas festas tradicionais; pelas disputas jornalísticas elegantemente talhadas; pelo crescente número de obras comercializadas; pela inauguração do Liceu Maranhense; pela intensificação da atividade tipográfica e pelo significativo número de periódicos criados (MARTINS. (2006). Op. cit. p. 96).
O destaque desse grupo de poetas, jornalistas, historiadores e tantos outros intelectuais, favoreceram para o reconhecimento de um Maranhão potencializado não somente na economia, mas, em especial, na sua atuação intelectual. A sociedade maranhense, de fato, viveu um período de esplendor na cultura, mas isso não foi o bastante para que ela se considerasse superior às demais. Contudo, o Maranhão moldado à educação e ao costume de vida européia, considerou-se cultíssima e contribuiu para a idealização de um presente glorioso e que deveria ser conhecido por todas as gerações. Assim, criou-se então o mito da Atenas brasileira, sendo compreendida nessa perspectiva devido ao fato de:
O mito não está, no entanto, obrigatoriamente contra a história. Ele tanto pode ser usado para remeter a um passado que se quer manter vivo, tornando a presente continuidade de um passado que se constrói como foi o caso dos mitos tecidos pelos tradicionalistas, como pode ser usado para valorizar uma descontinuidade entre o presente e o passado. Quando o mito se humaniza, se encarna na história, faz a história possível; torna a utopia material (ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz. A invenção do nordeste e outras artes. São Paulo: Editora Cortez, 2001. p. 193).
Porém, na segunda metade do século XIX, a fase áurea das atividades intelectuais da plêiade da Atenas brasileira, entraria em baixa com a morte de alguns de seus representantes e com a emigração de alguns ícones para outras Províncias, na tentativa de obterem reconhecimento intelectual. Outro fator concorrente para o caos desse grupo maranhense está relacionado à crise algodoeira, enfrentada pela Província, nessa mesma época. A partir da escassez das atividades intelectuais e do declínio da economia – postulou-se um discurso de decadência na região maranhense. Esse sentimento de decadência parece comum no Ocidente, pois,
Aquella floração intellectual brilhante, artificial, extinguia-se. A poesia e a criação estylizavam-se na grammática e na copia de clássicos verbais, longínquos e estranhos. Os que deviam trazer a seiva nova ainda não eram entendidos. A intelligencia desertou do seu antigo solo e seu êxodo e o das forças da mocidade, precipitaram a decrepitude. A preguiça espiritual marcava o ritmo moroso [...] (HOBSBAWM, Eric. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. p. 21).
Entretanto, nas décadas de 1870 e de 1890 – posterior à fase assombrosa, vivida pelos literatos da época – surge outro grupo de intelectuais (os Novos Atenienses) que almejava resgatar, reconstruir o período áureo da cultura maranhense. Ícones como José Ribeiro do Amaral, Antônio Lobo, Fran Paxeco, Justo Jansen, Antonio Lopes da Cunha, Domingos de Castro Perdigão, José Nascimento Moraes, Antônio Baptista Barbosa de Godóis e tantos outros que formavam os Novos Atenienses. A literatura maranhense, desse período, outorgava a esses intelectuais, a responsabilidade de “firmar” / “confirmar” e divulgar as promessas de um passado áureo, vivido pela provinciana São Luís, que, por extensão, lhe instauraram a crença mitológica da “Atenas clássica”, naquele período, pois, lá, se constituía um nicho de expressiva representatividade intelectual, por isso, postulavam a responsabilidade de “guardiões” a esses mecenas que, buscando reconhecimento nacional de sua cultura, num momento histórico, marcado por grandes tensões de natureza geral, sobretudo na ordem das idéias, sem, contudo, obterem sucesso.
Os Novos Atenienses proporcionaram ao Maranhão, a construção e a reforma de alguns espaços já existentes, para resguardarem e perpetuarem a memória do grandioso passado, que teria elevado a vida cultural da Província. Então, foram destinados ao Liceu Maranhense, a Escola Normal, a Escola Modelo, a Escola de Música, a Renascença Literária, a Biblioteca Pública e a Academia Maranhense de Letras, a importância de preservar e propagar o ideal de que o Maranhão seria culto por essência.
Quanto à instituição Academia Maranhense de Letras (AML), criada pelos Novos Atenienses é, indubitavelmente, uma das instituições que merece destaque, pois, por meio dela, esse grupo de jovens intelectuais honrava as tradições literárias do Estado. A AML foi fundada em 1908, tendo como precursora a Oficina dos Novos – instituição criada em 1900 com uma estrutura organizacional nos moldes das Academias.
A lista de fundadores da Academia Maranhense de Letras apresenta um
número significativo de intelectuais, dos mais reconhecidos àqueles que tiveram menor destaque, mas nem por isso, dignos de esquecimento. A exemplo, registra-se o nome de Maranhão Sobrinho, como ocupante da cadeira de nº 19, patronímica de Teófilo Dias e como patrono da cadeira de nº 21. O referido poeta, quando indicado para receber as honras de fundador da AML, já não se encontrava em São Luís, pois havia migrado para Belém (PA), em busca de melhores condições de vida.

Acredita-se que um dos motivos que possa ter contribuído para que o nome de Maranhão Sobrinho constasse como um dos fundadores da Academia Maranhense de Letras esteja relacionado ao fato dele haver estudado na Escola Normal e conhecido Antônio Lobo – principal idealizador dos propósitos da AML e freqüentador assíduo dessa instituição. Os ingressos de Maranhão Sobrinho à Escola Normal possibilitaram algumas mudanças positiva ao aproximar-se de nomes altamente representativos daquele período, resultando na sua efetiva entrada naquele “clube fechado” em razão de seus propósitos, pois conheceria outros poetas dispostos a divulgar as novas idéias estéticas e
a perpetuar o mito da Atenas.
No âmbito do desenvolvimento das atividades intelectuais executadas pelos Novos Atenienses, exaltavam-se as atitudes desse grupo de estudiosos. Compreendia-se que mais um período de opulência intelectual vinha progredindo a cada dia no intuito de resguardar e reconstruir a história de uma época nostálgica.
Aos anos de apatia e marasmo que se seguiram à brilhante e fecunda agitação literária, de que foi teatro a capital deste Estado, nos meados do século findo, e que ficará marcado para honra e gloria nossa, uma das épocas mais fulgentes da vida intelectual brasileira, substituiu-se, afinal, uma fase franca de revivescência intelectual, que desde o início, vem progressivamente caminhando, cada vez mais acentuada e vigorosa, destinando-se a reatar as riquíssimas tradições de nossas letras, que a muitos já se afigurava totalmente perdida (LOBO, Antônio. (1970) Op. cit. p. 4 e 5).
A Academia Maranhense de Letras, enquanto “lugar de memória” apresentou papel fundamental ao dar credibilidade ao mito da Atenas Brasileira. Contudo, essa mesma instituição, com o passar dos anos, não serviu mais como meio para satisfazer os anseios de seus literatos. A partir daí, muitos intelectuais migraram para outras regiões objetivando o triunfo de suas produções. Estes homens almejavam reconhecimento e condições mais favoráveis para expandir as suas idéias e vivências intelectuais. Maranhão Sobrinho deu a si mesmo, a possibilidade de viver a experiência do exílio, em favor do crescimento intelectual, saindo do Maranhão em 1903, muito antes da fundação da AML.
Aqueles que insistiram em viver insulado em São Luís, em detrimento do metropolitismo reinante, havia apenas uma escolha: dar continuidade às atividades intelectuais e de conservar a opulência literária conquistada em outros tempos, uma vez que a AML havia se constituído para esse fim – a glorificação intelectual unida ao papel de reacender o período áureo da cultura maranhense. Assim, os Novos Atenienses deixavam evidente em seus discursos, o desejo de manter vivo, o ideal da Academia Maranhense de Letras.
Ao Maranhão, cabe a responsabilidade, imensurável, de zelar pela memória desses antepassados; o dever moral e intelectual de transmitir às gerações vindouras e à presente, o amor à sapiência, valor incontentável para a vida, o amor às belas letras e o grande culto respeitoso ao valioso patrimônio que lhe foi confiado (REVISTA da Academia Maranhense de Letras, Ano 80, v. 20. dez. 1998. p. 15).
Percebemos, então, que o percurso da cultura maranhense obteve oscilações significativas no âmbito das suas melhores conquistas e no declínio das mesmas. Contudo, notamos que todos esses intelectuais tiveram um mesmo objetivo em comum – fazer renascer a fase esplêndida da Letras no Maranhão e perpetuar á todas as gerações, suas tradições culturais elaboradas a partir do mito Atenas. Preocupavam-se em elaborar atitudes que honrasse e que, ao mesmo tempo, socorresse a cultura do Estado: “a marcha prosseguirá porque um só ideal, que é puro e sacrossanto, nos anima e nos irmana, sob a bandeira de nossos patronos – o de fazer eterna a glória do Maranhão Atenas” ( Discurso pronunciado por Mário Meireles na sessão comemorativa do cinqüentenário da Academia, a 10 de agosto de 1958. Revista da Academia, Ano 80, v. 20, dez, 1998. p. 175).
Meio aos costumes europeus e pelo fato da Europa ser considerada, naquele momento, berço da cultura intelectual, a forma de agir, de pensar, de educar e de fazer política dos ludovicenses mudou de modo significativo, após o Maranhão receber fortes influências européias, na época de sua fundação. No âmbito das letras, os intelectuais maranhenses tiveram inspirações nas obras dos escritores de destaque do continente europeu, entre estes se destacam Paul Verlaine, Rimbaud, Stefane Mallarmé e Charles Baudelaire.
DOIS POEMAS DE MARANHÃO SOBRINHO

Poeta Maranhão Sobrinho
SATÃ

Nas margens de cristal do Danúbio do sonho,
cromadas de rubis, de pérolas purpúreas,
vê-se o imenso solar sonolento e medonho
do dragão infernal das Princesas espúrias...

Guarda o nobre portal de alabastro tristonho
desse antigo solar, de malditas luxúrias,
em que fulge o brasão heráldico do sonho
não sei quantas legiões de duendes e fúrias!

Sobre o mármore azul das colunas austeras,
que, em noivados de luz, o luar engrinalda
brilha o vivo cristal de alígeras quimeras...

Velam desse dragão o oriental tesoiro,
sobre um trono de rei, de maciça esmeralda,
dois soberbos leões, de grandes patas de oiro...



SOROR TERESA

... E um dia as monjas foram dar com ela
morta, da cor de um sonho de noivado,
no silêncio cristão da estreita cela,
lábios nos lábios de um Crucificado...

somente a luz de uma piedosa vela
ungia, como um óleo derramado,
o aposento tristíssimo de aquela
que morrera num sonho, sem pecado...

Todo o mosteiro encheu-se de tristeza,
e ninguém soube de que dor escrava
morrera a divinal soror Teresa...

Não creio que, de amor, a morte venha,
mas, sei que a vida da soror boiava
dentro dos olhos do Senhor da Penha...



Pesquisa e texto final:

Raimundo Fontenele


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