13 de set. de 2016

CRIME DA ULEN - O KENNEDY QUE MORREU EM SÃO LUIS



Deu no New York Times: Americano é assassinado no Brasil. A notícia publicada há 80 anos relatou a morte de John Harold Kennedy, 31 anos. Dois tiros disparados pelo maranhense José de Ribamar Mendonça, 25, bilheteiro de bondes da Ulen Company, atingiram e mataram o contador da empresa, na Rua da Estrela, em São Luís, no dia 30 de setembro de 1933.

Sessenta e seis anos depois do homicídio, o jornal britânico The Guardian noticiou: Brasil viu o primeiro ato na tragédia dos Kennedys. Apesar de o nome de John Harold não constar na árvore genealógica oficial da família, o periódico acolheu uma versão local, segundo a qual teria sido confirmada por um cônsul dos Estados Unidos a informação de que Harold seria irmão ilegítimo de Joseph, o pai de John F. Kennedy, presidente americano assassinado em 22 de novembro de 1963 em Dallas, Texas.

Muitos consideram que a chamada maldição dos Kennedy começou com a morte de Joseph Joe Junior, irmão mais velho de JFK, em 12 de agosto de 1944, na explosão do avião que pilotava, durante a Segunda Guerra Mundial, na Inglaterra. Um dos indícios do parentesco do Kennedy morto no Maranhão com o ex-presidente, entretanto, é que ambos nasceram no estado de Massachusetts.

TRÊS JULGAMENTOS A morte de John Harold foi imediata, mas o drama de Mendonça durou 11 anos, entre 1933 e 1944. Passou por três julgamentos em todos eles absolvido - e provocou uma crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos, envolvendo nove ministros brasileiros e três embaixadores americanos. O livro Morte na Ulen Company (Record, 1983), de José Joffily, narra a dimensão política e social dada aos fatos.

A assinatura de contrato entre a empresa americana e o governo maranhense para realização de obras públicas e posterior administração de serviços - dentre eles, transporte, luz e água - ocorreu em 1923. Inicialmente recebida com a perspectiva de solução para problemas graves enfrentados pela população, tornou-se, em pouco tempo, motivo de reclamações.

A constante elevação das tarifas, baixos salários pagos aos empregados locais e a arrogância dos representantes da Ulen estavam entre as principais queixas da comunidade. Jornais do Maranhão e de outros estados criticavam termos do contrato, considerado abusivo.

Foi neste contexto que o bilheteiro, demitido poucos dias antes de completar dez anos de serviços e conquistar a estabilidade na empresa, matou Kennedy. A vingança pessoal ganhou ares de clamor público antiamericano, especialmente contra os administradores da Ulen.

A Coordenadoria do Arquivo e Documentos Históricos do Tribunal de Justiça preserva a carta testemunhável requerida por Russel F. Kennedy, irmão de Harold. O documento solicitado com o intuito de recorrer ao Supremo Tribunal Federal, após as três absolvições de Mendonça e à negativa da instância superior a um recurso extraordinário seu, apresenta atos registrados no período.

Preso em flagrante, Mendonça foi levado a júri popular pela primeira vez em 21 de novembro de 1933. Waldemar de Sousa Brito foi um de seus advogados de defesa.

Uma das astúcias dele foi ter enrolado o José Mendonça na bandeira brasileira, perante o conselho de sentença, como se dissesse: vocês é que têm que exercer a soberania, que é inerente ao Tribunal do Júri. Nós temos que mostrar para os americanos que aqui também nós temos Justiça, destaca o juiz José Eulálio Figueiredo de Almeida, escritor e pesquisador de julgamentos que fizeram história no Maranhão.

Mendonça foi absolvido por cinco votos a dois, sob o argumento de que se achava em estado de perturbação dos sentidos e de inteligência. O promotor Edson Brandão apelou da decisão, que foi anulada pela Câmara Criminal do então Superior Tribunal de Justiça do Maranhão, com o fundamento de não ter havido prévia perícia técnica.

No segundo julgamento, em 18 de abril de 1934, o júri o absolveu por unanimidade, reconhecendo que o réu cometeu o crime para evitar mal maior.

O terceiro julgamento só se realizaria 11 anos depois do crime, apesar do protesto do advogado, alegando não ser possível fazer retroagir uma lei nova para prejudicar o réu, já que Mendonça havia adquirido direito dentro do então revogado Código do Processo Criminal do Estado.

O ex-bilheteiro já vivia desde 1935 no Rio de Janeiro, contratado pela Companhia Atlantic de Petróleo, quando foi mais uma vez preso. Trazido para São Luís, encarou o terceiro julgamento do tribunal do júri e de novo foi absolvido, desta vez por legítima defesa.


Em 6 de dezembro de 1944, Russel Kennedy entrou com recurso no Supremo, usando a carta testemunhável. Mendonça morreu oito anos depois, de infarto, no local de trabalho.

Fonte: http://tj-ma.jusbrasil.com.br/

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