caramelo - hamish blakely |
Mais uma vez ele estava a pensar
naquela noite, mais uma vez igual a todas as outras noites, dos últimos três
anos. Podia lembrar-se do barulho da música que tocava ao fundo, do ar de
fumaça e claro do perfume cálido que persistiu durante meses em suas entranhas.
Era agosto e pra seu desgosto a lembrança ardia como brasa na fogueira dos dias
atuais, feito um anjo caído ele percorria as esquinas daquela metrópole em
busca de tudo ou nada que fizesse sentido. Algo que tivesse um início um meio e
um fim, afinal a solidão é a ausência de tudo aquilo que podia ser, e para ele
até então nada havia sido, por isso ele estava ali no inicio daquela noite, a
procura dessa marca que preenchesse essa lacuna que era como sombra a
acompanhar seus passos na escuridão.
Uma mão tocou-lhe a costa de forma
leve, muito levemente, ao virar era ela, a filha querida, o motivo de orgulho
de seus pais na infância e na adolescência presenteada com a alcunha de ovelha
negra. De onde teria ela saído, de onde aqueles olhos teriam vindo? Quantos
caminhos até chegar ali a poucos centímetros do dele. Como num flash não era
mais a esquina o local onde se encontrava, e sim uma sala grande toda envolta
de branco, uma profunda calmaria ele sentia em seu interior, não havia móveis,
quadros, somente o vão enorme daquele espaço e uma mulher agachada de costas
para ele, vestida de negro, tipo alguém que sai por ai vestida pra matar. Até o
momento nenhuma palavra, mas seus lábios encharcados estavam por conta da
imagem dela, sua à libido foi ao limite quando ela virou e disse coisas com um
só olhar que nenhum livro que ele havia lido tinha feito.
O sinal estava dado, as margens queimavam feita a sarça, suas pálpebras
pressionavam com dificuldade aqueles olhos sedentos de vida, de morte, de quase
tudo, de tudo daquela mulher. Ai ela veio ao seu encontro e logo após o lapso,
o vulto dela desapareceu na fluidez do tempo, e quando o psicanalista perguntou
o último detalhe que lembrava, ele respondeu, ela tinha entre as pernas o mais
curto caminho para o inferno.
Por Natan Castro
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