É
rica e farta a bibliografia sobre esta obra ímpar de Gonçalves Dias, as
Sextilhas de Frei Antão, publicadas originalmente, em 1848, no seu segundo
volume de poesias o SEGUNDOS CANTOS E SEXTILHAS DE FREI ANTÃO, onde o poeta
deixa entrever a sua grande cultura poética e lingüística, recriando tempo e
memória numa saga essencialmente lusitana (gestas, trovas, cantigas de amor,
etc.), conforme podemos aprender um pouco mais nestas
CONSIDERAÇÕES
SOBRE AS SEXTILHAS DE FREI ANTÃO
Publicados
em 1846, os Primeiros Cantos brindavam uma literatura empenhadíssima em afirmar
sua autonomia em relação à matriz lusitana, com o primeiro grande exemplo de
poesia autenticamente nacional. Dois anos depois, Gonçalves Dias lançava seus
Segundos Cantos, causando considerável surpresa para o leitor que,
provavelmente à espera da batida épica dos borés que ritmavam algumas das
primeiras “poesias americanas”, deve ter sentido o ouvido entortar – como diria
Drummond – ao eco do sotaque lusitano daquelas sextilhas vertidas em linguagem
propositadamente arcaica, com que o poeta dava fecho à sua nova obra. Para
escândalo dos mais nacionalistas, o poeta indianista parecia agora movido por
um impulso que, à primeira vista, corria a contrapelo daquele que norteava o
livro anterior no sentido da afirmação da autonomia literária da jovem pátria.
Ao invés do canto de saudade do sabiá sobre a palmeira, composto no exílio
coimbrão, a evocação nostálgica partia agora do solo pátrio em direção às
terras de além-mar, distantes não apenas no espaço como no tempo:
“Bom
tempo foy o d’outr’ora
Quando
o reyno era christão;
Quando nas guerras de mouros
Era
o rey nosso pendão,
Quando
as donas consumião
Seos
teres em devação”.
Com esses versos, Gonçalves Dias abria suas
Sextilhas de Frei Antão, obra única em nosso Romantismo, quer pela matéria
tratada, quer pelo exercício de linguagem e estilo. Talvez mesmo em toda a
literatura brasileira só encontraremos paralelo para esse gênero de composição
com um poeta modernista que foi também um dos principais intérpretes da obra
gonçalina: Manuel Bandeira, cujo “Cantar de Amor”, composto “à maneira de
provençal” (como na conhecida cantiga de D. Dinis, que lhe fornece a epígrafe
de abertura e o modelo do poema), parece retomar o mesmo espírito de
experimentação arcaizante inaugurado entre nós pelo poeta maranhense. Espírito
esse que, a meu ver, não foi ainda hoje devidamente interpretado pela crítica.
Começo,
pois, por considerar a gênese dessa obra em que Gonçalves Dias, valendo-se de
um arremedo de português arcaico, assume as vestes de um certo frei Antão de
Santa Maria de Neiva para cantar as excelências da época de ouro da nação
lusitana, em longos poemas de talhe narrativo. Mais precisamente, trata-se de
loas e solaus (bem ao gosto do medievalismo coimbrão, notadamente do Trovador,
que retratam casos exemplares de “fé e valentia”, colhidos nos reinados de
Afonso V (“Loa da Princeza Sancta” e “Gulnare e Mustaphá”), de D. João II (
“Soláo do Senhor Rey Dom João”) e de Alphonso Henriques (“Soláo de Gonçalo
Hermiguez”).
“Quem nos diz que o mais valente
Deva de ter mais razão,
Porque seja sua dona
Como hum vaso de eleição?”
“Seria coiza de ver-se
E coiza de mui folgar,
Ver um dragão de mulher,
Chamada a bella sem par,
À pura força de espada,
Sem mais pôr, nem mais tirar!”.
“Estes mouros na verdade
Qu’esprito e graça que têm?
Quando vos dizem mentiras,
Sabem dize-las tão bem,
Que havemos de perdoar-lhes,
E em cima querer-lhes bem”
“Deixemos pois estas coisas;
Bem qu’eu não saiba fallar,
Senão com longos rodeios:
(Vem-me o séstro de pregar)
Quando me julgo no cabo,
Mais longe estou de acabar”
(Extrato
do livro-tese NOS TEMPOS DE ANTÃO, de Vagner Camilo, doutor em Teoria Literária
pela UNICAMP, excelente estudo sobre a obra Sextilhas de Frei Antão, do nosso
Inesquecível
poeta Gonçalves Dias)
Pesquisa
de Raimundo Fontenele, poeta e escritor maranhense
muito lindo
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