23 de fev. de 2016

Nowhere Man



Por Natan Castro

Ele havia deixado para trás família, emprego, amigos e uma velha companheira a música. Com passos desdenhosos concentrava-se somente em andar sempre adiante, dia e noite, noite e dia. Quando sentia fome sentava-se onde desse, pensava um pouco, olhava ao redor e vezenquando achava uma lata de lixo ou conseguia algo mais apropriado num desses restaurantes de beira de estrada, desses que raramente separam restos de comidas para pessoas necessitadas. Nunca mais havia fitado os olhos de um ser humano, na verdade já havia esquecido a ultima vez que isso havia acontecido. Naquele homem, que naqueles dias mais parecia um farrapo humano nada no passado interessava, muito menos no futuro e tampouco algo do presente. Era aquele homem algo análogo a um pássaro que muito sem pensar estar sempre à espera da próxima revoada em direção a um lugar qualquer.

A barba cada vez mais longa, assim como o cabelo que cobria quase a sua visão. Faziam daquele homem uma visão incógnita aos olhos dos passantes, quem poderia imaginar que por detrás daquelas vestes sujas, daquele andar trôpego estava um homem exemplar. Um cidadão admirável, passar assim desapercebido era seu intuito. Muito raramente ele parava nos parques e fixava o olhar em crianças que por lá brincavam, aquilo de alguma forma lhe inspirava, ou quem sabe lhe incentivava a continuar sua caminhada. Ele nunca mais sorrirá, porém algumas vezes deixava poucas lágrimas rolarem por sua face. Certa vez em meio a uma chuva torrencial de um inverno rigoroso, ele se viu encostado junto a janela de um bar, com a roupa totalmente encharcada, com muito frio e fome e era noite, ele parou para ouvir um pianista que tocava uma peça conhecida. Ficou ali durante toda a execução da música e ao final chorou copiosamente, muito emocionado sentou-se no chão e as lágrimas se confundiram com as gotas de chuva que caiam continuamente do céu, e ali adormeceu em meio ao temporal noturno, naquela cidade desconhecida, somente as notas daquela canção lhe eram familiares.

O que havia se tornado nem ele mesmo mais fazia ideia de saber. Continuou assim por longos anos, sempre de cidade em cidade a buscar por nada, a desejar sempre tão pouco, a caminhar no limite da exaustão. No caminho, a cada quilometro que ficava para trás, ficava também um pouco de outro homem, que outrora muitos conheciam e também muitos aprenderam a admirar, mas que em determinado momento de sua vida, resolveu partir. Com causas que talvez nunca consigamos entender e somente ele pudesse revelar, mas isso era o que menos lhe interessava, ou para ser bem mais sincero acho nunca nem lhe passou pela cabeça, essa súbita ideia de explicar algo, deixar pistas, os motivos da sua debandada rumo a esse seu mundo interior.

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