Noite
adentro fiquei sabendo que aquela mulher era a Sandra Rosa Madalena, conhecida de
todos os bares da região, boêmia contumaz passava a noite rodando os bares,
sempre com aquele olhar de cigana, existia em sua aparência um lance flamenco, brushes
carregados nos cílios, seu nome fora dado pela mãe, uma puta que no auge da
corrida pelo ouro em Serra Pelada ficou conhecida por chamar a atenção dos
garimpeiros quando dançava o hit Sandra Rosa Madalena do cantor Sidney Magal. Com
o passar das horas a quase inconsciência total havia chegado, lembro-me de
alguns flashes do Jornalista Antero Sousa agarrado a uma senhorita dançando no
meio do salão do bar.
De
repente eu acordei era um raio de sol que invadia aquele quarto, uma dor de
cabeça horripilante esmagando meus neurônios quase me impedindo de raciocinar,
fechei os olhos e depois de alguns instantes abri, colocando a mão em cima dos
raios de sol que atingiam meu rosto. Eu estava deitado numa cama, no canto do
quarto uma mulher pelada sentada em frente a uma penteadeira, sentei na cama e
a cabeça girava e girava, cai na cama e novamente peguei no sono. Quando acordei
novamente procurei por um relógio encontrei meu celular em cima da penteadeira
no canto do quarto, embaixo do celular um bilhete que dizia.
-
Esperei você acordar, mas como já era tarde e tinha que sair para dar aula resolvi
não te acordar. Assinado S.R
No
mesmo papel do bilhete uma indicação que havia uma cópia da chave do quarto na
primeira gaveta do lado esquerdo da penteadeira ao abrir lá estava a tal chave,
me vesti, a tontura havia passado um pouco, uma fome furiosa arrasava meu
estômago, retirei a carteira do bolso da calça abri e contei os mesmos trocados
que havia colocado um dia antes quando resolvi ficar a até a madrugada na
Biblioteca. Na bolsa encontrei um cartão com o nome e os contatos do jornalista
Antero Sousa. Fui embora dali era uma pensão próximo a Avenida Magalhães de
Almeida, sai e subi em direção ao fim da Rua Grande. Já eram quase duas da
tarde entrei numa transversal e invadi o primeiro restaurante que vi, pedi um
PF três minutos depois lá estava eu devorando a comida com intercalados goles
de água, ressaca braba, no meu caso só acabava com carboidratos e água,
bastante água.
De
noite em casa as ideias voltavam ao lugar, e as perguntas voltaram também com
toda a voracidade que lhes é peculiar. O cego que não era cego porra nenhuma,
as palavras do delegado com a cabeleira igual a do Roberto Carlos, o “inferninho”
a cigana de olhar agridoce que se chamava Sandra Rosa Madalena. Ao traçar essa
linha de lembranças consecutivas, uma pergunta dentro das várias chamou mais
atenção, como fui parar no quarto dela, é fato que estava bêbado, tivemos algo
no bar? Não me lembro de trocarmos palavras somente de uma troca de olhares. Resolvi
ligar para o jornalista ver se ele podia me ajudar.
-
Depois de uns quatro toques o celular foi atendido.
-
Alô!
-
Alô é o Antero, Antero Sousa, o jornalista?
-
Sim é ele!
-
Amigo aqui é o rapaz, estivemos ontem a noite na delegacia e depois no bar.
-
Sim, me lembro, e ai como vai a ressaca? Risos
-
Porra foi braba, mas já estou quase recuperado totalmente.
-
Você tem o telefone daquela moça que se vestia parecida com uma cigana?
-
Sim, a Sandra Rosa, vou te passar.
-
Ele me passou o telefone e disse.
-
Ai cara depois te ligo, ainda preciso saber mais sobre como tu fostes te meter
naquela roubada com o cego 171.
-
Blz, sem problemas.
Já
eram quase onze horas da noite quando resolvi ligar para ela, quando atendeu eu
conseguia ouvir ao fundo um barulho de música, me identifiquei, ela lembrou,
agradeci por ter me acolhido naquela noite, ela se mostrou muito simpática,
disse para não me preocupar, essas coisas acontecem. Perguntei quando podia encontra-la,
tomar uma cerveja, saber mais sobre sua vida. Ela me respondeu que no outro dia
depois do horário comercial, pois dava aula no turno vespertino, marcamos no
local. E no horário marcado eu estava lá. Depois de uns vinte minutos ela
chegou, algo me chamou a atenção, as roupas, a forma de se vestir era outra, os
cílios não estavam sobre os olhos, invés do vestido uma calça jeans colada e
uma blusa de grife, aquele rosto de olhar insinuante havia dado lugar a um
olhar terno, porém instigante, era visível o ar de casualidade na sua pessoa
naquele inicio de noite.
Conversamos
bastante sobre diversos assuntos, ela era formada em letras, sua mãe era
Paraense com parentes em São Luís, na adolescência ela havia vindo às férias e
nunca mais voltou, ficou morando com os parentes e hoje mora sozinha, não tinha
filhos, e dividia seu tempo entre as aulas em escolas públicas e leituras. Percebi
com o vai e vem da conversa que possuía certo conhecimento sobre literatura em
geral, os clássicos todos já tinha lido ou tentado ler, isso não a afastava dos
novos nomes da literatura, desde os best-sellers e os nomes que despontavam como
grandes promessas literárias.
Em
dado momento lembrei que até então ela não havia respondido se dormimos juntos,
sexo, um inicio de um romance, lembrava pouca coisa o álcool sempre cortava
partes da memória do que tinha acontecido horas antes. Não quis cortar o
andamento do papo com essas perguntas, até porque parecia ser outra mulher ali
na minha frente, ou seria o álcool que me dera àquela impressão de mulher fatal
da noite anterior. Já era tarde quando ela pediu um táxi e se foi, quando
voltei a mesa, percebi que caíra da bolsa dela uns papéis, peguei dobrei-os e
coloquei no bolso de trás da calça. Dentro do ônibus retirei os papéis do bolso
e li aquilo que parecia ser a capa de um documento, lá estava escrito “Arte e cultura maranhense, o histórico
problema da aceitação da nossa gloriosa tradição, hostis entre os nossos”.
Continua...
Por
Natan Castro
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