23 de mar. de 2017

UMA NO CRAVO E OUTRA NA FERRADURA

           A coluna QUARTA FEIRA É DIA DE RF do nosso blog LITERATURA LIMITE (WWW.literaturalimite.com.br) de hoje intitulada UMA NO CRAVO E OUTRA NA FERRADURA traz dois assuntos bem distintos. Um artigo literário e algumas anedotas políticas, e a unir estes dois temas um fato em comum: ambos são frutos da inteligência e da pena (no sentido figurado, pois hoje nem escrever se escreve mais, digita-se, non é vero?) de dois escritores maranhenses, que gozam de grande prestígio no cenário literário brasileiro (Josué Montello) e maranhense (Benedito Buzar).
            O primeiro é o artigo do escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, celebrado romancista, autor de Os Tambores de São Luís e da trilogia memorialística Diário da Manhã, Diário da Tarde e Diário da Noite, ale de inúmeros outros livros de igual importância e valor. No seu artigo, publicado em 1971 no Jornal do Brasil, Josué aborda a questão dos grupos e movimentos maranhenses de literatura, apropriadamente intitulado, o artigo, Um novo grupo maranhense.
O segundo momento da nossa coluna é sobre o livro POLITIQUEIROS POLITICALHA POLITIQUICE POLITICAGEM POLÍTICA DO MARANHÃO, do escritor e acadêmico da AML Benedito Buzar, autor da importante obra histórica O VITORINISMO –  Lutas Políticas no Maranhão de 1945 a 1965. O POLITIQUEIROS segue a linha dos livros de folclore político, fatos reais que de tão inusitados e engraçados terminam por se tornar quase anedóticos.
Selecionamos apenas algumas passagens para o deleite dos leitores e julgamos que está mais do que na hora de um relançamento deste livro de tão apreciável leitura do escritor Benedito Buzar. (RF)  
UMA NO CRAVO

Um novo grupo maranhense
Josué Montello: Jornal do Brasil, 1971

“Dos 19 capítulos em que dividiu a sua História da Literatura Brasileira, um, o 11º, consagrou-o José Veríssimo ao estudo dos poetas e prosadores do Maranhão, no meado do século passado (lê-se século XIX).
Tão importante foi esse grupo literário que, a um só tempo, deu ele ao Brasil o seu mais importante prosador, João Francisco Lisboa, e o seu mais alto poeta lírico Antônio Gonçalves Dias.
O grupo teve mesmo um biógrafo, que retraçou a vida ilustre dos companheiros, Antônio Henriques Leal os quatro volumes do Panteon Maranhense, lá mesmo esplendidamente editados por Berlamino de Matos, fizeram de seu autor o Plutarco da geração admirável. Para maior glória dessa obra exemplar, não lhe faltou sequer a crítica violenta, com intenções declaradamente demolidoras, que lhe desfechou na província um crítico azedo e inteligente, Frederico José Correia, nas 200 e poucas páginas de Um Livro de Crítica. Para que se tenha uma idéia deste volume, basta ler o seu programa de bordoada: “O meu fim com este livro é desmascarar a impudente cotérir e não consentir que ela zombe por mais tempo da credulidade e paciência pública, nesta dita Atenas brasileira, onde ela principalmente se aninhou tem produzido numerosa prole.”
Por esse tempo, a capital maranhense era uma pequena cidade de 40 mil habitantes, sem escolas superiores, e apenas com um ginásio oficial, o velho Liceu. Suas comunicações com o resto do mundo se faziam espaçadamente e por via marítima. No entanto, era de ordem a sua atualização intelectual que, no mesmo ano da Questão Coimbrã, a polêmica era comentada em São Luis no prefácio de um livro, A Casca da Caneleira.
Depois da geração do Panteon Maranhense, outras se tem constituído, ao longo do tempo, com o mesmo pendor das letras, na minha cidade natal. Se estes não chegaram a ombrear-se com aquela, na mesma teoria de valores literários, pelo menos serviram a resguardar uma bela tradição cultural, de que eu próprio me beneficiei, há 30 e tantos anos, quando por lá me emplumei pra estes meus modestos vôos de beira de telhado. Recentemente, numa de minhas habituais idas a São Luis, pude mais uma vez sentir e reconhecer que meus conterrâneos se mantém fiéis ao gosto das letras, e de lá trouxe comigo dois dos mais importantes livros de poesia que se publicaram ultimamente em língua portuguesa: Do Eterno Indeferido, de Nauro Machado, e Pele e Osso, de Bandeira Tribuzi.
Esses dois grandes poetas, que vivem na província e de lá irradiam seu nome e sua obra para todo o país, dão bem a medida da altitude literária do Maranhão contemporâneo – tanto na técnica de expressão poética, quanto na profundeza e originalidade de suas inspirações. Cada um deles segue o seu próprio caminho. Se Bandeira Tribuzi é mais transparente na forma depurada de seus versos [alguns deles concebidos sob a lição das elegias camoneanas], Nauro Machado serve, sobretudo ao mistério da poesia – uma poesia fechada e esquiva que nos obriga a debruçar sobre ela pra lhe penetrar aos poucos a beleza profunda.
Não exagerei em afirmar que ambos se situam entre as mais altas vozes da moderna poesia brasileira. E é desvanecedor reconhecer ainda que outros poetas jovens, como Lauro Leite Filho, Fernando Braga, Viriato Gaspar, Calos Cunha, Raimundo Fontenele, Chagas Val, Benedito Buzar, Reginaldo Telles e Ubiratan Teixeira – para citar apenas alguns – seguem o exemplo de Tribuzi e Nauro no gosto de iguais dedicações literárias.
Comporão esses poetas um novo grupo maranhense? Presumo que sim – sobretudo considerando que a ele igualmente pertencem um João Mohana, um Erasmo Dias, um José Chagas, uma Arlete Nogueira da Cruz, um Fernando Moreira, um Murilo Ferreira, um Jomar Moraes, um Américo Azevedo Neto, como romancistas, contistas e ensaístas.
São Luís tem hoje, no plano da cultura, condições de florescimento e atualização que não tinha à hora em que se constituiu e afirmou a geração de João Lisboa. São maiores, assim, as responsabilidades de seus poetas e prosadores.”

E OUTRA NA FERRADURA  


            Do livro Politiqueiros, Politicalha, Politiquice, Politicagem Política do Maranhão, do escritor Benedito Buzar:
ALCOÓLATRA
O jornalista José Chagas, na sua coluna no Jornal do Dia, endereçou críticas ao deputado Nagib Haickel pelo fato dele ter se afastado do senador José Sarney e ficado ao lado do governador Nunes Freire.
Como não era político de levar desaforo para casa, Nagib pediu a palavra na Assembleia Legislativa para se defender dos ataques do jornalista e o denunciar por ser boêmio, chegando até a acusá-lo de ser alcolátra.
O deputado José Brandão, sentado na primeira fila, pediu um aparte a Nagib para explicar que o nome era alcoólatra e não alcolátra como ele esta se referindo ao jornalista.
Num rasgo de ferina inteligência, Nagib não se deu por perdido:
 – Para caboclo de Pindaré, como eu, existe uma diferença entre alcoólatra e alcolátra. Quem bebe cachaça é alcolátra e quem bebe uísque é alcoólatra.
AVE PARA AVE
Na qualidade de Ministro do Trabalho, o senador Jarbas Passarinho veio a São Luís para manter contatos com as autoridades estaduais.
A Câmara Municipal de São Luís convidou o ministro para receber uma homenagem. Designado pela Mesa, para saudar o ministro, o vereador Luís Alves, mais conhecido pelo apelido de Papagaio, começou o seu discurso:
– A tarefa que me foi dada, Sr. Ministro, é das mais gratas, porque vou falar de ave para ave. Enquanto Vossa Excelência é Passarinho, eu sou Papagaio. Por isso, dirijo-me a Vossa Excelência de asas abertas...
BOCA FECHADA
            O deputado Maneco Paiva, representante do município de Pinheiro, vinha sendo criticado pela imprensa por não discursar na Assembleia Legislativa.
            Preocupado com a situação, resolveu ir ao Palácio dos Leões para ouvir a opinião do governador Pedro Neiva de Santana, seu conselheiro nas horas  de aflição, e saber sobre a conveniência de fazer um pronunciamento com o sentido de se livrar das críticas endereçadas a sua atuação.
            Após ouvir as apreensões do parlamentar de Pinheiro, Pedro Neiva de Santana aconselhou:
– Deputado, fique calado enquanto puder, pois boca fechada não entra mosca e não cria problema com o governo.
BAIXA E ALTA
Quando o senador Vitorino Freire abandonou a militância partidária, em 1970, jamais se imaginou que ele voltaria a ter influência ou poder de decisão na política maranhense.
O prefeito de São Luís, Haroldo Tavares, participava de uma reunião em que se discutia a sucessão de seu cunhado  – o governador Pedro Neiva de Santana  – na qual Vitorino atuava desassombradamente. Dele partiu a explicação mais arguta sobre o retorno triunfal de Vitorino Freire à política maranhense:
– Quando os militares estavam em baixa, Vitorino investiu neles. Agora, que estão em alta, colhe juros, dividendos e correção monetária.
COMEMORAÇÃO LITÚRGICA
O governador Pedro Neiva de Santana não gostava de comemorar seu aniversário no Palácio dos Leões. Avesso a esse tipo de festa, convidava no máximo seus auxiliares imediatos para um jantar íntimo na casa de veraneio, na praia de São Marcos.
No último ano de governo, um prefeito telefonou para o seu Secretário Particular, Oséas Martins, querendo saber se ia haver alguma festividade no palácio em comemoração ao aniversário de Pedro Neiva.
Consultado sobre o assunto, o governador mandou este aviso ao prefeito:
– Só vai haver hóstia e vinho de missa. E, se ele quiser participar da solenidade, que trate o quanto antes de se confessar.
COMER BOLO
O município de São Domingos resultou de um projeto do deputado Gonçalo Moreira Lima. Ao ser criado, Gonçalo foi à presença de Eugênio Barros para cobrar a nomeação do novo prefeito, pois havia tomado conhecimento de que o governador estava querendo nomear um político que não era seu correligionário.
– Governador: estou aqui para lhe fazer uma pergunta: se Vossa Excelência faz um bolo, gasta ovos, leite, açúcar, manteiga. Quando pronto, come ou dá para outros comerem?
Eugênio respondeu:
– Claro que vou querer comer o bolo.
Gonçalo Moreira Lima voltou à carga:
– Assim como Vossa Excelência preparou o bolo, eu preparei o município de São Domingos. Portanto, acho que tenho o direito de indicar o novo prefeito.
CILADA BRIGADEIRISTA
Na eleição de 1946, para Presidente da República, em pleno processo de redemocratização do país, eram candidatos o general Eurico Gaspar Dutra, pelo PSD, e o brigadeiro Eduardo Gomes, pela UDN. A campanha eleitoral no Maranhão estava violenta entre os vitorinistas e oposicionistas.
Em Codó, num grande baile popular, promovido pelos correligionários do candidato do PSD, em que estaria presente o coronel Sebastião Archer da Silva, os brigadeiristas tramaram uma cilada aos vitorinistas e contrataram um sanfoneiro para executá-la.
No momento que os vitorinistas entraram no salão da festa, o sanfoneiro começou a executar a música com dinheiro ou sem dinheiro, mas com a seguinte letra:
                                   Com dinheiro ou sem dinheiro
                                   Eu vou votar no brigadeiro
                                   Eu não sou filha da puta
                                   Para votar no Gaspar Dutra
O baile terminou em pancadaria entre os adeptos de Dutra e do brigadeiro.
CÓCORAS
Um dos candidatos mais falados à sucessão do governador José Sarney era o deputado federal Henrique de La Roque Almeida.
Modesto e humilde, sempre que o assunto vinha à tona, procurava não comentá-lo para evitar que se tornasse alvo de pressões políticas.
Numa de suas visitas a Imperatriz, Sálvio Dino perguntou se a sua candidatura ao governo do estado estava de pé.
La Roque humildemente retrucou:
– Está de cócoras.

Pesquisa e texto final:
Raimundo Fontenele

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