31 de mai. de 2017

VESPASIANO RAMOS: UMA CENTELHA POÉTICA

                    Este é o nosso Homenageado do Mês: VESPASIANO RAMOS. Muitas vezes o brilho incandescente de uma grande estrela termina por ofuscar o brilho de outras estrelas menores, que se supõe de luz menos fulgurante, de menor intensidade.  Assim, deixa-se de contemplar estes outros brilhos, entre os quais pode se encontrar luz de grande fulgor.
         No Maranhão, a existência de um poeta da grandeza e dimensão de Gonçalves Dias parece, numa expressão chula, deixar seus contemporâneos e sucessores no chinelo. Seria apenas uma meia verdade, porque por um desses desígnios das Musas, dos Oráculos, dos Deuses, enfim, o Maranhão é uma terra pródiga de poetas e poesia.
         E uma dessas estrelas, aparentemente menores, é o poeta Vespasiano Ramos. Caxiense, de família pobre de recursos materiais, e apesar de uma existência curtíssima, apenas 32 anos, e tendo produzido apenas uma obra, o livro Cousa Alguma, além de outros trabalhos publicados em revistas e jornais da época, o poeta conseguiu fazer com que alguns de seus poemas se tornassem verdadeiros clássicos da poesia romântica brasileira.
         Um destes poemas é o SAMARITANA, de inspiração bíblica, e que atende a todas as exigências da escola romântica, uma delas provocar grande emoção e sentimentos intensos de paixão, misericórdia e toda a lenga lenga de copiosos românticos.
         O poema CRUEL apresenta o poeta em toda a sua plenitude poética, sua técnica refinada, usando de forma inusitada o recurso da repetição e construindo um dos belos poemas daqueles anos em que cantar o amor e a paixão, a solidão e o sofrimento, e abandono da amada, e temperar este abandono e sofrimentos com noitadas de álcool, fumo e sexo, num tempo em que não existiam os antibióticos, apressou a vida de muitos dos nossos menestréis.
         Enfim, aqui estão alguns poemas que melhor ilustram o que de Vespasiano Ramos dissemos. Além dos poemas, apresentamos três trabalhos: um do escritor Jomar Moraes, e dois artigos, um de Cláudio Paiva e outro do poeta Wybson Carvalho, caxiense como o nosso homenageado do mês. Interessante que alguns parágrafos iguais estão presentes em ambos os textos, e ficamos sem saber quem é o verdadeiro autor dos referidos textos.
         Não vai aqui nenhuma crítica, apenas uma observação: no soneto ÂNSIA MALDITA existiam apenas 13 versos, em todas as publicações que encontrei, o que me levou a acrescentar ao primeiro quarteto mais um verso. Embora não esteja à altura dos versos do poeta homenageado, apenas procurei não tornar disforme uma forma poética que é rígida, a do soneto, que se compõe de 14 versos, dois quartetos, e dois tercetos. (RF)
Alguma Biografia
         Joaquim VESPASIANO RAMOS, nasceu em Caxias a 13 de agosto de 1884 e faleceu em Porto Velho (RO), no dia 26 de dezembro de 1916.
         Nasceu nas condições mais humildes e desde cedo começou a trabalhar no comércio local, no entanto buscando sempre o saber tornou-se um viajante compulsivo, que o levaria ao conhecimento de outros povos: durante a sua vida viajou por quase toda a região norte e também pelo sul do Brasil.
         Publicou sua obra poética em diversos jornais e revistas de seu tempo. É considerado o precursor da literatura em Rondônia.
         Em sua homenagem foi construído um grande centro recreativo, em Rondônia, e no Maranhão, uma das mais belas praças da capital recebe o seu nome.
         É patrono da cadeira n° 32 da Academia Maranhense e da cadeira n°40 da Academia Paraense de Letras. Faleceu aos 32 anos em Porto Velho no estado de Rondônia, sendo sepultado no Cemitério dos Inocentes. Em homenagem ao centenário de sua morte, seu jazigo foi restaurado e reinaugurado em 06 de junho de 2016.

VESPASIANO  RAMOS: UM POETA ENTERRADO E ESQUECIDO EM RONDÔNIA

(CLÁUDIO PAIVA, para revista Momento Brasil - Gente de Opiniao)
         Que ele foi uma personalidade de alto nível cultural, conhecido em todo o Brasil e exterior, quase todo mundo sabe. O que muita gente não sabe, no entanto, é que o ilustre e saudoso poeta Vespasiano Ramos viveu os últimos dias de sua vida em Porto Velho, onde morreu (aos 32 anos de idade) e foi sepultado no dia 26 de dezembro de 1916, no legendário Cemitério dos Inocentes, na Capital rondoniense.
         Até hoje é uma celebridade admirada e reverenciada por toda essa nova geração de poetas, dentre os quais citam-se: João Teixeira de Souza (JT), Francisco Matias, Matias Mendes, Emanuel Pontes Pinto, Sílvio Persivo e a sempre irreverente Yêdda Pinheiro Borzacov.
         Poeta de um livro só, "Coisa Alguma", com apenas três edições desde 1916, Vespasiano Ramos alcançou a imortalidade com poesias simples e cariciosa, em que tão nitidamente se refletem os seus estados de alma.
         Filho de Antônio Lúcio Ramos e Leonília Caldas Ramos, nasceu Joaquim Vespasiano Ramos (Quincas, na intimidade e nas rodas boêmias), em Caxias, no Maranhão, a 13 de agosto de 1884, no largo da Igreja de São Benedito, hoje Vespasiano Ramos.
         Segundo o escritor maranhense Walfredo Machado, Vespasiano Ramos "começou a trabalhar no comércio como caixeiro, desde os 13 anos, interessado pelos estudos, aprendia sozinho, sem professor, a um canto da loja, nos momentos de folga, escrevendo versos em papel de embrulho".
No início do século participava de um grupo intelectual formado por Alfredo de Assis Castro, João Rodrigues e Joaquim Luz, época em que criaram o jornal "A Mocidade". Outros jornais surgiram em Caxias, como o "Jornal do Comércio", "O Sabiá", "O Mensageiro", "O Zéphiro" e o "Correio do Sertão", onde eram publicados os versos de Djalma de Jesus - um dos mais conhecidos pseudônimos de Vespasiano Ramos.
         Passou grande parte de sua vida em Belém, para onde afluíram homens de letra como Humberto de Campos, Lucídio Freitas e Quintino Cunha.
Para a escritora Yêdda Borzacov, Vespasiano Ramos era "sentimental por índole e por condição de vida, torturado por um grande amor sem esperança". Segundo Francisco Matias, o saudoso poeta procurou na poesia uma compensação para os momentos de intimidade com sua alma, nas horas não dissipadas na voragem da sua boêmia.
         A revelação de um grande poeta lírico, que, mesmo com seus defeitos e descuidos, pode ser colocado no mesmo plano de um Paul Géraldy e muitos poetas amorosos do seu tempo, demonstra toda a beleza de seus versos, quando proclama:
                            É o amor, o amor, a causa extraordinária
                            Deste grande sofrer, desta grande tortura:
                            Só ele faz penar minh'alma solitária
                            No cárcere de dor desta alta desventura.
         Para Matias Mendes, Vespasiano Ramos "não passou de um suave e delicado romântico, notando-se em sua poesia repassada de ternura e melancolia o vestígio daquele legado de tristeza e desalento que nos veio do século XIX".
         Entusiasmado pelas publicações de "Sombra Pagã" e de "Carvalho Guimarães", Vespasiano Ramos retornou a São Luís onde residia seu irmão Heráclito Ramos, também poeta, com o fim de custear sua estada no Rio de Janeiro e a publicação de "Coisa Alguma". Além do apoio, ainda ganhou a companhia do próprio irmão. E, das mãos do editor Jacintho Ribeiro dos Santos, surgiu "Coisa Alguma", em 1916. "Tenho o privilégio de possuir um volume dessa edição", ressalta Yêdda Borzacov, lembrando que foram impressos apenas mil volumes.
         Segundo os historiadores porto-velhenses, em 1913, foi fundada a Academia Paraense de Letras. Carlos Roque, em sua Antologia da Cultura Amazônica, Vol. II, afirma que Vespasiano Ramos pertenceu a essa Instituição que, muitos anos depois criou um concurso de poesias com o nome de Vespasiano Ramos que foi o patrono da Cadeira nº 40, da citada Academia. Elmano Queiroz, ocupante atualmente dessa Cadeira, fazendo elogio do poeta, diz que "Vespasiano cantou como cantam os passarinhos, improvisando harmonias, sem partitura escrita, mas em arroubos sutis de suave inspiração".
         Um fato curioso e que, talvez, poucas pessoas saibam: em 1948, Anísio Viana, modesto caxiense, juntou algum dinheiro e veio a Porto Velho, com a finalidade única de depositar flores e acender velas no túmulo do poeta, no Cemitério dos Inocentes, deixando-se fotografar. Essa foto, segundo o professor Cid Teixeira de Abreu, se encontra no arquivo da Academia Maranhense de Letras, da qual Vespasiano Ramos é patrono da Cadeira nº 32.
         "A glória de um poeta vem quando ele passa a ser recitado, na rua, na praça, nas escolas, nos bares e botequins: é a glória da popularidade. E esta Vespasiano Ramos já tem", acrescenta a historiadora, que é filha do saudoso doutor Ary Tupinambá Penna Pinheiro, que também era poeta e escritor.

VESPASIANO RAMOS
Jornal: O Estado do Maranhão  (22 de setembro de 2010)
Por: Jomar Moraes
         Contava eu vinte e poucos anos quando, sargento da Polícia Militar, fui designado para servir em Buriti Bravo, onde assumi as funções de delegado de polícia. As distinções de que me cumularam naquela então pequena cidade, proporcionaram-me relacionamentos muito diversos e intensos. Um pequeno grupo de amigos era formado por universitários filhos da terra, e que ali passavam todos os períodos de suas férias escolares. Pequena e seleta parcela desse grupo seleto era formada pelos irmãos Hernani (Farmácia), Cláudio (Direito) e Clóvis Batista Ribeiro (Medicina), todos de saudosa memória, pois que precocemente falecidos, e ainda por um primo deles, Ubiracy Fonseca Coelho (Agronomia). Aproximava reciprocamente o grupo, que comigo formava um quinteto, a acalorada exposição dialética de assuntos e problemas econômico-sociais, todos do particular interesse de nossas idades, e muito oportunos, em razão das convizinhanças do Golpe de 64.
         Mas para além das discussões apaixonadas que às vezes nos punham sob passageiro estremecimento, um ponto de convergência havia, que nos mantinha irmanados: as tertúlias e serestas lítero-etílicas, em que todos concordávamos acerca da mesma cerveja estupidamente gelada e, sempre que possível, servida e sorvida a partir de garrafas de casco preto, preferencialmente vestidas de noiva. Nesses alegres e memoráveis mutirões boêmios, tocávamos, cantávamos e declamávamos muita poesia. Repito que declamávamos, porque era mesmo declamação, com todos os efes e erres que o protocolo da época exigia, que nós nos rejubilávamos ouvindo e fazendo ouvir os sonetos Ao Cristo, Samaritana, Ânsia Maldita e os poemas Sulamita, Guerreira, além de outros mais. Do sumarento e apetecível cardápio de iguarias poéticas eram sempre compulsórias pièces de résistance poemas famosos de Vespasiano Ramos, o malsinado poeta que arrostou, durante sua breve e sofrida existência, a dor de ver seu amor publicamente recusado, apesar do recurso extremo de que lançou mão, após diversas tentativas frustradas de conquistá-lo, segundo narra testemunha insuspeita e presencial do fato, meu querido e saudoso amigo Raymundo Carvalho Guimarães (1899-1998), Mundico Leite para os íntimos.
         Em seu livro Esparsos colhidos (São Luís: Sioge, 1986), Mundico Leite, acerca do poeta que muitos anos depois viria a ser seu patrono (Cadeira 32) na Academia Maranhense de Letras, conta este episódio que se lhe gravou indelevelmente na memória, a despeito de o haver presenciado com muito pouca idade: em uma tertúlia lítero-musical, como costumeiramente realizavam as famílias de Caxias e alhures, à hora das declamações, adiantou-se a todos os demais o ainda bem jovem, porém já reconhecido e admirado poeta Vespasiano Ramos, que, pateticamente ajoelhado, olhos fitos e súplices, dirigiu-se à bela moça Lili Bittencourt, por quem ardia de paixão, e declamou, entre lágrimas, longo poema repleto de súplicas que, porém, não lograram demover Lili.
         É que, como, na conhecida poesia de Drummond, Quadrilha, o “Joaquim que amava Lili”, não alcançando ser por ela amado, a bem dizer “suicidou-se” pela ingestão desregrada de álcool e de paixão obsessiva, mas Lili terminou casada com João Bastos, “que não tinha entrado na história”, e, por ironia, era grande amigo do poeta.
         Esse poema (Ante uma Mulher), transcrito por Vespasiano Ramos no álbum de versos de Lourdes Cunha, ter-se-ia para sempre extraviado, segundo pensava Mundico Leite. Tal não ocorreu, porém.
         É que, miraculosa providência da musa Érato fez com que o poema aparecesse em Os Novos, Boletim da Oficina dos Novos, de onde o transcrevi para este livro. Também, enquanto viveu, Mundico Leite guardou esse poema em sua prodigiosa memória, e fê-lo reproduzir no seu discurso de posse na AML.
         Outro poema longo de Vespasiano, ausente de seu único livro e julgado de problemática recuperação, porque jacente em velhos jornais de Belém, é Guerreira, muito declamado nas já referidas serestas buritibravenses. Encontrar Guerreira numa envelhecida e pouco legível edição do jornal O País, de Caxias, foi vencer um pequeno, mas importante combate. E, num certo sentido, voltar aos tempos da juventude em Buriti Bravo.
         Se, a exemplo do que disse o glorioso Bruxo do Cosme Velho (Memórias póstumas de Brás Cubas), o menino é o pai do homem, possivelmente algum liame genealógico haverá de correlacionar o jovem de ontem com o velho de hoje, que, por sua própria iniciativa, tomou a si a tarefa de reeditar, quanto possível acrescentado, o poeta de Samaritana.
         Como sabido, reúne este volume a 4ª edição de Cousa alguma…, único livro publicado por Vespasiano Ramos, já a poucos meses de sua morte, aos 32 anos de idade. Reúne ainda a marginália que me foi possível encontrar, e que está reproduzida na seção Dispersos Reunidos. Com certeza não consegui reunir todos os dispersos do poeta, que parcialmente jazem em velhos jornais de Belém, Manaus, Porto Velho e, possivelmente, de Teresina. É tarefa a ser cumprida por quem de melhores condições que eu disponha.

CEM ANOS SEM VESPASIANO RAMOS
Wybson Carvalho é poeta e membro da Academia Caxiense de Letras
(Fonte: O Estado do Maranhão – 26 de dezembro de 2016)
         No dia de 26 de dezembro (segunda-feira), o poeta Vespasiano Ramos, esquecido na sua terra, completa um século que fora encantado, pois poeta não morre se encanta. Os restos mortais de Vespasiano Ramos estão repousando no Cemitério dos Inocentes, em Porto Velho – Rondônia. Patrono da cadeira nº 32 da Academia Maranhense de Letras, da nº 40 da Academia Paraense de Letras e da nº 05 da Academia Caxiense de Letras, o caxiense Vespasiano Ramos morreu em Porto Velho (Rondônia).
         No estado do Norte, o escritor tem reconhecimento oficial como homem das letras. Como caxiense, João Castelo (PSDB), há muito tempo, prometeu trazer para o Maranhão os restos mortais do escritor caxiense Joaquim Vespasiano Ramos (1884-1916). A promessa de Castelo, conterrâneo e parente de Vespasiano Ramos, em visita à ACL, foi feita ao presidente da Academia Caxiense de Letras, Jacques Inandy, e aos seus confrades: Renato Menezes, Jotônio Viana, Edison Vidigal e Wybson Carvalho, entre outros presentes à estada de João Castelo à Casa de Coelho Neto.
         Mas, na década de 1980, o próprio João Castelo, quando exercia a função de chefe do Executivo Estadual no Maranhão, sancionara uma Lei nº 4225, datada, precisamente, de 18 de novembro de 1980, que autorizava a trasladação dos restos mortais de Vespasiano Ramos, do cemitério da cidade de Porto Velho, para a cidade de Caxias, sua terra berço. Naquela época, o Projeto de Lei nº 055/80, fora proposto pelo então deputado estadual, também caxiense, João Afonso Barata, e, após aprovação legislativa, devidamente, encaminhado pela Assembleia Legislativa maranhense ao Poder Executivo do Maranhão. Barata justificara a Lei pela consagração pública aos homens, que, em vida, em face ao cunho cultural, elevaram o nome do Maranhão nas letras e nas artes.
         Porém, àquela época a imprensa e os intelectuais da Academia Maranhense de Letras, não fizeram menção alguma sobre o porquê do não cumprimento da Lei sancionada pelo então governador João Castelo. Agora, no entanto, os imortais caxienses embora ansiosos pelo cumprimento da Lei, não poderão mais trasladar os restos mortais do poeta face ao jazigo no qual repousam os restos mortais do poeta ter sido tombado pelo patrimônio cultural de Rondônia.
Reconhecimento em Rondônia
         Que ele foi uma personalidade de alto nível cultural, conhecido em todo o Brasil e exterior, quase todo mundo sabe. O que muita gente não sabe, no entanto, é que o ilustre e saudoso poeta Vespasiano Ramos viveu os últimos dias de sua vida em Porto Velho, onde morreu (aos 32 anos de idade) e foi sepultado no dia 26 de dezembro de 1916, no legendário Cemitério dos Inocentes, na Capital rondoniense.
         Até hoje é uma celebridade admirada e reverenciada por toda essa nova geração de poetas, entre os quais, citam-se: João Teixeira de Souza (JT), Francisco Matias, Matias Mendes, Emanuel Pontes Pinto, Sílvio Persivo e a sempre irreverente Yêdda Borzacov.
         Poeta de um livro só, “Coisa Alguma”, com apenas três edições desde 1916, Vespasiano Ramos alcançou a imortalidade com poesias simples e cariciosa, em que tão nitidamente se refletem os seus estados de alma.
         Filho de Antônio Lúcio Ramos e Leonília Caldas Ramos, nasceu Joaquim Vespasiano Ramos (Quincas, na intimidade e nas rodas boêmias), em Caxias, no Maranhão, a 13 de agosto de 1884, no largo da Igreja de São Benedito, hoje Vespasiano Ramos.
         Para Matias Mendes, Vespasiano Ramos “não passou de um suave e delicado romântico, notando-se em sua poesia repassada de ternura e melancolia o vestígio daquele legado de tristeza e desalento que nos veio do século XIX”.
         Entusiasmado pelas publicações de “Sombra Pagã” e de “Carvalho Guimarães”, Vespasiano Ramos retornou a São Luís onde residia seu irmão Heráclito Ramos, também poeta, com o fim de custear sua estada no Rio de Janeiro e a publicação de “Coisa Alguma”. Além do apoio, ainda ganhou a companhia do próprio irmão. E, das mãos do editor Jacintho Ribeiro dos Santos, surgiu “Coisa Alguma”, em 1916. “Tenho o privilégio de possuir um volume dessa edição”, ressalta Yêdda Borzacov, lembrando que foram impressos apenas mil volumes.
         Segundo os historiadores porto-velhenses, em 1913, foi fundada a Academia Paraense de Letras. Carlos Roque, em sua Antologia da Cultura Amazônica, Vol. II, afirma que Vespasiano Ramos pertenceu a essa Instituição que, muitos anos depois criou um concurso de poesias com o nome de Vespasiano Ramos, que foi o patrono da Cadeira nº 40, da citada Academia. Elmano Queiroz, ocupante atualmente dessa Cadeira, fazendo elogio do poeta, diz que “Vespasiano cantou como cantam os passarinhos, improvisando harmonias, sem partitura escrita, mas em arroubos sutis de suave inspiração”.
         Um fato curioso e que, talvez, poucas pessoas saibam: em 1948, Anísio Viana, modesto caxiense, juntou algum dinheiro e veio a Porto Velho, com a finalidade única de depositar flores e acender velas no túmulo do poeta, no Cemitério dos Inocentes, deixando-se fotografar. Essa foto, segundo o professor Cid Teixeira de Abreu, se encontra no arquivo da Academia Maranhense de Letras, da qual Vespasiano Ramos é patrono da Cadeira número 32.
         “A glória de um poeta vem quando ele passa a ser recitado, na rua, na praça, nas escolas, nos bares e botequins: é a glória da popularidade. E esta Vespasiano Ramos já tem”, acrescenta a historiadora, que é filha do saudoso doutor Ary Tupinambá Penna Pinheiro, que também era poeta e escritor.
         Preservar os patrimônios históricos e culturais faz parte do planejamento turístico da região. Partindo deste princípio, a Superintendência Estadual do Turismo (Setur), com o apoio da Academia Rondoniense de Letras, reformou os jazigos de dois ícones da história de Rondônia.
         A solenidade de restauração dos jazigos históricos do poeta Vespasiano Ramos e do major Emmanuel Silvestre do Amarante reuniu convidados, autoridades civis e militares, além de membros da Academia Rondoniense de Letras (ARL) numa tarde do mês de junho deste ano, no Cemitério dos Inocentes, em Porto Velho.
         Durante a solenidade, o superintendente de Turismo, Júlio Olivar, destacou que a intenção da Setur é salvaguardar o patrimônio histórico de Rondônia. “Cemitérios são museus a céu aberto e estes túmulos são verdadeiros monumentos históricos, imprescindíveis para compreensão da nossa história, Vespasiano no mundo das letras e o major Amarante como cientista e integrante da Comissão Rondon”, destacou Júlio.
         Vespasiano Ramos, nascido na sede do município de Caxias, no largo da Igreja de São Benedito. Desde sua meninice, enquanto trabalhava no comércio da Princesa do Sertão, passava o tempo, nas suas folgas momentâneas, talhando versos em papel de embrulho, solitário em um canto da loja.
         Autodidata, já rapazinho sempre estava em companhia de rapazes mais velhos e de influentes intelectuais caxienses do início do século passado e só sentia-se verdadeiramente à vontade em saraus, tertúlias e assembléias literárias, pois era ali que sua alma sensível e poética enlevava-se e o seu corpo de estatura média e de pele morena esbanjava talento e causava admiração nas belas moças caxienses daquela época.
         Dentre seus amigos e companheiros, amigos da poesia e da boemia, podemos elencar os que lhe influenciaram imensamente: Alfredo Assis de Castro, Joaquim Luz e João Rodrigues (Fundadores do jornal a Mocidade), Carvalho Guimarães, Miguel Beleza, Milton Vilanova, Professor Melo Vilhena, Leôncio Machado Filho (Diretor do jornal O Paiz), Nereu Bittencourt, Durval Vidigal, Cromwel Carvalho (Editor do jornal O Bloco), Raimundo Costa Sobrinho (Proprietário do jornal O Maranhão) e o velho Jornalista Luís José de Mello (Diretor-proprietário do Jornal de Caxias).
         Segundo Raymundo Carvalho Guimarães, da Academia Maranhense de Letras, Vespasiano Ramos escrevia para todos os jornais caxienses e maranhenses da época e “publicava os seus versos, não só sob o nome como pseudônimos diversos, entre os quais o mais popularizado o de Djalma de Jesus”. Ademais, a pesquisa histórica comprova que entre os anos de 1903 e 1916, Vespasiano Ramos colaborou significativamente como os seguintes jornais caxienses: O Zéphiro, Correio do Sertão, O Janota, O Parnaso, O Independente, O Binóculo, Jornal do Comércio, O Parthenon, A Luz, A Gruta de Lourdes, A Pena, O Mensageiro, A Renascença, O Sabiá, O Lilaz, O Caixeiro, Belo Horizonte e O Bloco.
         Em 1916, Vespasiano Ramos desloca-se até o Rio de Janeiro para a publicação de seu livro “Cousa Alguma”, que foi editado por Jacintho Ribeiro dos Santos, tendo sido recebido com grande receptividade nos meios literários da Cidade Maravilhosa. Muitos intelectuais da época teceram altos elogios à grandiosa obra do jovem caxiense. Osório Duque Estrada, Carvalho Guimarães, do Jornal do Brasil, Alberto de Oliveira, Humberto de Campos, Goulart de Andrade, Felix Pacheco, Medeiros de Albuquerque dentre muitos outros intelectuais e eruditos reconheceram, então, a precocidade do autor de Cousa Alguma, bem como viram nele o herdeiro mais próximo de Gonçalves Dias.
         Ainda em 1916, Vespasiano Ramos deslocou-se do Rio de Janeiro para Belém e, logo após, Manaus e, depois, Porto Velho. Consoante pesquisa de Raymundo Carvalho Guimarães, “em Porto Velho, agravou-se o seu já precário estado de saúde e na casa de João Alfredo de Mendonça, cercados dos cuidados desse grande amigo, faleceu na tarde de 26 de dezembro de 1916, com a idade de 32 anos”.
         A vida de Vespasiano Ramos esteve diretamente relacionada com a paixão e com a boemia. Assim demonstram seus versos. Viveu apaixonado por um amor não correspondido. Viveu apaixonado “por um amor que consagrou a uma moça filha de uma família das mais distintas de Caxias, amor que com sua frustração o conduziu a uma vida desregrada e boêmia (…) escrevendo versos nas mesas dos botequins, esbanjando talento, e desgastando a saúde”. Todos os homens têm sua musa a lhe inspirar e, como Gonçalves Dias tinha sua Ana Amélia e, também, nós outros, Vespasiano Ramos, para a nossa felicidade tinha, a sua: Lili Bittencourt, eterno amor do poeta.

ALGUNS POEMAS DE VESPASIANO RAMOS
                            SAMARITANA
                            Piedosa gentil Samaritana:
                            Venho, de longe, trêmulo, bater
                            À vossa humilde e plácida cabana,
                            Pedindo alívio para o meu viver!
                             Sou perseguido pela sede insana
                            Do amor que anima e que nos faz sofrer:
                            Tenho sede demais, Samaritana
                            Tenho sede demais: quero beber!
                             Fugis, então, ao mísero que implora
                            O saciar da sede que o consome,
                            O saciar da sede que o devora?
                             Pecais, assim, Samaritana! Vede:
                            – Filhos, dai de comer a quem tem fome,
                            – Filhos, dai de beber a quem tem sede.
                            CRUEL
                            Ah, se as dores que eu sinto ela sentisse,
                            se as lágrimas que eu choro ela chorasse;
                            talvez nunca um momento me negasse
                            tudo que eu desejasse e lhe pedisse!
                            Talvez a todo instante consentisse
                            minha boca beijar a sua face,
                            se o caminho que eu tomo ela tomasse,
                            se o calvário que eu subo ela subisse!
                            Se o desejo que eu tenho ela tivesse,
                            se os meus sonhos de amor ela sonhasse,
                            aos meus rogos talvez não se opusesse!
                             Talvez nunca negasse o que eu pedisse,
                            se as lágrimas que eu choro ela chorasse
                            e se as dores que eu sinto ela sentisse! . . .
   
                            SONETO
                            (fatalidade )
                             Desde esse instante, sem cessar, maldigo,
                            aquele instante de felicidade!
                            Para que tu vieste ter comigo,
                            meu amor, minha luz, minha saudade?!
                             Dês que te foste, foram-se contigo
                            todos os sonhos desta mocidade...
                            A tua vinda - fora-me um castigo;
                            a tua volta - uma fatalidade!
                             Dês que te foste, dentro em mim plantaste
                            a ânsia infinita dos desesperados
                            porque voltando, nunca mais voltaste...
                             Correm-me os dias de aflições, cobertos:
                            eu entrei para o amor de olhos fechados
                            e saí para a dor de olhos abertos!

                            POBRE AMOR
                            Quando de ti me afastaram,
                            Que sentimento! que dor!
                            Sei que meus olhos choraram,
                            Quando de ti me afastaram.
                                     Pobre amor!
                            Tu surpreendeste, cantando,
                            Meu coração, ao luar!
                            Lembro-me bem que foi quando
                            Eu vinha desabrochando
                                     Para amar!
                            E é grande fatalidade
                            Sem lenitivos à dor,
                            Não seres minha, é verdade,
                            É grande fatalidade,
                                      Pobre amor!         
                            Tua lembrança, formosa,
                            Mil desenganos me traz:
                            Nunca mais, alma ditosa,
                            Para os teus braços, formosa,
                                     Nunca mais!
                            O sonho de minha vida,
                            Pobre de mim, sonhador!
                            Toda esperança é perdida,
                            O sonho de minha vida.
                                     Pobre amor!
                            Pudesse esta alma, pudesse,
                            Esquecendo-te, viver,
                            Se um outro amor lhe viesse,
                            Talvez esta alma pudesse
                                      Te esquecer!
                            Esquecer! Desiludida
                            De te esquecer, linda flor,
                            Eu tenho esta alma perdida,
                            O sonho de minha vida,
                                     Pobre amor!
                            ÂNSIA MALDITA
                            Ninguém mais do que tu saberá quanto
                            Padeço, agora! e, em lágrima, advinha
                            A minha'alma apagar-se, neste pranto,
                            Que se derrama, junto às avezinhas.*
                            Beatriz! Alma em flor! Suave encanto,
                            Que me salvar, pensei, dos altos, vinha:
                            O quanto peno, o quanto sofro, enquanto
                            Imagino que nunca serás minha!
                             Foram, por ti, as lágrimas que os olhos
                            Meus derramaram! só por ti, somente
                            Que minh'alma, do Amor contra os escolhos,
                             Há de, convulsa, soluçar, um dia,
                            A derradeira lágrima pungente
                            E o derradeiro grito de agonia!
·        *Este verso não se encontra em nenhuma das versões
por mim consultadas (RF)

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