HORA DE GUARNICÊ, Ê MEU BOI! (final)
O FOLHETIM DA SEMANA do nosso blog
LITERATURA LIMITE (acesse-o no link www.literaturalimite.blogspot.com.br)
pega carona nestes festejos juninos, para trazer aos leitores a esquecida coletânea
HORA DE GUARNICÊ – Poesia Nova do Maranhão, edição promovida pela FUNDAÇÃO
CULTURAL DO MARANHÃO, São Luís, 1975.
Nesta última sequencia o final da
apresentação de Josué Montello e os poemas de
Francisco Tribuzi, Luís Augusto Cassas, Raimundo Fontenele, Rossini
Corrêa e Viriato Gaspar. (RF)
PRÓLOGO
Josué
Montello
(continuação...)
Jean Cocteau, ao
receber o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Osford, teve a
oportunidade de referir-se à experiência de um de seus amigos, o Professor
Pobers, que foi enviado às Antilhas para estudar o papel da telepatia entre os
naturais da terra. Para se comunicarem a grandes distâncias, dirigem-se estes a
uma árvore, e o certo é, falando-lhe junto ao tronco, conseguem ser
correspondidos nos seus recados e nas suas encomendas. Certo dia, ao ver uma
mulher a se comunica por esse processo, o Professor Pobers perguntou-lhe por que
motivo ela se dirigia a uma árvore.
E ouviu sua
resposta:
– É porque eu sou
pobre. Se fosse rica teria um telefone.
É possível que o
verso, para certos jovens, seja como a árvore da mulher antilhana: um instrumento
de comunicação transitório, que a própria vida se encarrega de substituir,
quando faz do moço um arquiteto, um aviador, um advogado, um professor, um
médico, um jornalista. Mas, para esses, que mudaram de instrumento, para
exprimir os seus instantes de sensibilidade ou de emoção, o verso não era o
instrumento essencial. Para o poeta verdadeiro, nenhum outro poderá
substituí-lo ou suplantá-lo. E é nessa coerência que está a confirmação da
vocação poética.
A geração de poetas
jovens do Maranhão, representada por esta antologia, não tem posição polêmica,
em relação à geração anterior, de que são magnas figuras, nos horizontes da
província, Nauro Machado, Bandeira Tribuzi, José Chagas, e a que também
pertencem, longe de São Luís, Ferreira Gullar, Lago Burnett e Tobias Pinheiro.
Estou me lembrando também de Odylo Costa, filho e Manoel Caetano; mas estes
pertencem a uma geração anterior, sobretudo o primeiro, que alcançou a glória
da Academia, como sucessor de Guilherme de Almeida, na cadeira que tem por
patrono Gonçalves Dias e foi fundada por Olavo Bilac.
É certo, que entre a
geração de Hora de Guarnicê e a de Nauro Machado, outro poetas existem na
Província, fiéis ao verso e à verdadeira poesia. Serão vozes dispersas, sem a
continuidade da criação essencial? É possível. A verdade é que, em muitos
deles, se prolonga o legado de arte que vem da geração de Gonçalves Dias. Digo
isto, não no sentido de antiguidade, mas da concordância dos valores líricos,
que são eternos.
Dos poetas aqui
agrupados, muitos são modernos pelo tema; outros, pelo verso; outros mais, pelo
verso e pelo tema. De qualquer modo, são todos eles expressões de nosso tempo,
e do Maranhão. Um Maranhão que não é mais o mesmo de minha juventude. E que já
buscando horizontes mais amplos, na linha das transformações radicais.
Essa transformação,
já refletida nos poemas de Hora de Guarnicê, tende a ampliar-se e
aprofundar-se. Dela os poetas hão de ser as vozes necessárias, como espelho,
concordância ou protesto.
Há alguns anos, no
Conselho Federal de Cultura, citei esta frase de Cocteau: “Eu sei que a poesia
é indispensável, mas não sei para quê.” Cassiano Ricardo, que me ouvia, logo
enristou o furabolos, protestando. E estendeu-se numa longa lição, que teve
sobretudo o mérito de converter o convertido, visto que eu citara a frase do
poeta francês para terminar reconhecendo que a poesia é essencial ao homem,
como um dos instrumentos – e talvez o melhor e o mais fino – de penetração dos
seus mistérios.
Cada um dos poetas
aqui reunidos traz uma mensagem de angústia, de indagação ou de intuição das
horas advindas. Por ela somos conduzidos ao pequeno mundo de suas verdades
interiores. E é para essa comunhão amiga – e fraterna – que todos eles nos
convocam com este livro.
JOSUÉ
MONTELLO
FRANCISCO TRIBUZI
Francisco José Santos Pinheiro Gomes nasceu em São Luís do
Maranhão, a 24 de janeiro de 1953. Filho do poeta Bandeira Tribuzi, foi buscar
também em origens familiares a vocação para a pintura, tendo já participado de
várias mostras de arte plástica.
ÍNTIMO
Vivo
no contido pessimismo
dos
poemas de Nauro Machado:
existir
de falso lirismo
e a dor contida no intocado.
Ninguém
(mesmo) pode saber
porque
viver é o medo de morrer
e o que mais se chora.
Sorrisos
são atos contra a vontade;
Tristeza,
sinônimo d eternidade.
Adeus
é não ir embora.
LUÍS AUGUSTO CASSAS
Luís
Augusto Cassas de Araújo nasceu a 2 de março de 1953, em São Luís, onde cursa a
Faculdade de Direito da Universidade do Maranhão. Participou das antologias
Mirante, Poesia Maranhense Hoje e Antologia do Movimento Antropáutica. Aos 19
anos de idade foi agraciado pela Academia Maranhense de Letras com a Medalha Graça
Aranha.
QUADRO COMPLETO DA NOITE
os postes procissão de sombras
de cimento armado socos no escuro
arqueados gatos homossexuais
sobre a rua (lua) automóveis descansando
parecem choros de crianças
costelas de concreto azulejos
asfixiando vagalumes
o pulmão canceroso ladeiras
da madrugada apitos
(um cachorro ladra) (um galo canta)
no
chão:
lágrimas
hidráulicas
saltam
das
órbitas dos esgotos
e
levam
estrelas
e ratos
pela
sarjeta
(amanhece)
Raimundo Nonato Fontenele, maranhense do interior do Estado, tem
26 anos de idade. Funcionário público, foi assessor da Coordenação Estadual do
MOBRAL. Um dos fundadores do Movimento Antroponáutica. Tem publicado Chegada
Temporal e Às Mãos do Dia, ambos de poesia.
A CAUDA DA ESTRELA
vaporizante
muda
onde
este anseio cala fundo
e
estende as mãos para tocar-te
doce
lírio
cravo
no madeiro que não sangra
sinal
de uma espera irremovível
das
penas de todos os pássaros
risca
e rabisca o céu com a omoplata
risca-rabisca
o mundo
junto
a tarde com os dedos
e
submerso entre cruzes rutilantes
toco-te
a cauda caudal vagalume
junto
a noite com os olhos
e
de repente
ela
se apaga e vai:
pombo
cinzento cerrado de neblina!
O LEITO
o
leito é o começar de outro rio
por
onde a foz de tudo inunda tudo
e
descreve na água círculo a círculo
um
perene correr que nunca funde-se
o
leito é o após-rio a antinoite
a
varar profundos córregos cansados
o
leito é o só pensar o acomodar-se
a
ser o barco a fluir em outro barco
o
leito é o demarcar do rio ao meio
de
lado a lado céu a terra e
areia
de lenço por onde a calma
é
todo um despejar de veros sonhos
até
depois da última lançada
onde
começa o mar e o mar acaba
CABEÇA DE POEIRA
o
que sobra das mãos
além
das veias
e
o gosto de sal
na
praia abandonado?
o
que sobra da roupa
entre
gestos
do
que por baixo foi roupa
e
hoje é tempo?
o
que sobra da fruta
senão
polpa
do
que por dentro erguemos
capturados?
ROSSINI CORRÊA
José Rossini Campos Corrêa nasceu em São Luís do Maranhão a 8 de
setembro de 1955. Foi membro da Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis-AMORC e
ativo colaborador da Página Universitária, suplemento publicado pelo Jornal
Pequeno.
VIETNÃO
(fragmento)
“ele aspirava a
tornar-se poeta, pintor
e compositor”
bertrand
russell
a)
HANÓI: ceifado por frágil carnaval
o carnaval de hipérboles,
poeta
Iro Yto.
Agradecemos
a preferência, e
BOA
NOITE
Iro,
por que sangrento
e genocidado ser
exposto ao pascer
úmido e brutal
que há na pomba
azul, vítima da bomba
de norte-excremento
ceifando sem digital?
Yto,
por que não/jacaré
sugando o pântano
forçado a vil/dano
de sorver o nu
suco de napalm e
navegar
por lama que
movimenta-o,
marcha-ré,
a
ti, pousada do urubu?
Iro
Yto,
necrosado
no
relento do
sepulcro, não há
flor,
vida ou verso...
..............................................................................................................
Iro
Yto,
necrosado
no
relento do
sepulcro, não há
flor,
vida ou verso...
a
autenticar o brado
que soou dobrado
som
de sino na voz
de quem lutou por nós
poeta
e soldado
,Iro Yto
liberdade...
liberdade...
b)
HANÓI: ceifado por frágil carnaval
o carnaval de hipérboles,
poeta
Iro Yto.
Agradecemos
a preferência, e
BOA
NOITE
VIRIATO GASPAR
Viriato dos Santos Gaspar nasceu em São Luís, a 7 de março de
1952. Detentor de prêmios literários da Academia Maranhense de Letras,
Prefeitura Municipal de São Luís e da Sociedade de Cultura Artística do
Maranhão. Figura nas antologias Poesia Maranhense Hoje, Antologia do Movimento
Antroponáutica e Esperando a Missa do Galo.
LENDA
TRISTE
(fragmento de um poema)
“era
uma vez um homem que sonhava
mudar
o mundo numa humanidade,
onde
a vida não fosse mera escrava
de
um negócio chamado autoridade.
era
uma vez um homem que lutava
por
transformar o homem em claridade;
mudar
a terra inteira (assim pensava)
numa
clara manhã de liberdade.
era
uma vez um homem que, tal Cristo,
pensou
mudar o mundo, e porque nisto
empregou
seu suor, seu tempo e fez
dessa
razão, razão de sua vida,
sua
esperança, sua bandeira erguida...,
era
uma vez um homem, era uma vez...”
Texto
final:
Raimundo
Fontenele
Valiosíssimo. Páginas da história da poesia no Maranhão, a antologia Hora do Guarnicê.
ResponderExcluirMuito boa página.
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