Setembro
avança. Mais alguns dias e a estação das flores, a Primavera, chegará com seu
sol e seu perfume. É como se saíssemos da umidade e do escuro para o alegre
colorido das árvores, folhas, flores e frutos e para o calor dourado do astro
rei. Continuamos firmes aqui no nosso Blog LITERATURA LIMITE (www.literaturalimite.com.br), e a
nossa coluna QUARTA FEIRA É DIA DE RF continua trazendo mais duas estações do
livro A VIA CRUCIS DE UM POETA SEM NOME. Boa leitura, amigos.
Sétima
Estação
OS HERÓIS
Heróis não se
masturbam de manhã,
nem acendem
velas pra seus orixás.
Mesmo não
sendo mudos,
heróis não
falam
sobre coisas
que desconhecemos,
O que cantam
os heróis
nem em sonhos
lembra
esses gritos
medonhos
essa
algazarra
que nos
empurram, dizendo:
“Ouça! Isto é
a música”.
Heróis
suspiram, sim,
porém, não
choram
as lembranças
doídas do passado.
Heróis usam
palavras que não temos
para escrever
ou descrever a poesia.
É muito mais
que silêncio,
é outra
coisa:
são sopros de vertigem
que há na
mente,
poeira
divina, martelo de Thor,
é nisso tudo
que os heróis
seguem
pensando.
Meus heróis?
Nem todos
morreram de overdose,
não são ou
foram cobaias de algum deus.
Tubos de
ensaio, sim,
desde o
nascimento
pra morrerem
com pompas de um rei.
Para o herói
não há tempo ruim
e não existem
começo e final,
a vida é como
é:
rabo de foguete,
um
pau-de-sebo,
uma gangorra
infiel
num carrossel
maluco
sem ordem e
sem lei.
Heróis
tristonhos
são escravos
libertos de outros sonhos
qual
bem-te-vis cantando ao sol poente
o amor que perderam,
ou algo assim
que ninguém
chora
e que ninguém
carrega
como eu,
dentro de mim.
Heróis são os
que chamo pelo nome:
Viriato
Gaspar, o primeiro que encontrei
de carne e
osso;
Nauro
Machado, e sua imensa e lírica fúria,
recriando na
terra outro universo;
Jamerson
Lemos, tão amigo e companheiro,
e Valdelino,
que se foram antes da hora.
E o Chagas
Val? E o Luís Augusto Cassas,
menino
prodígio da Rua das Hortas?
E o Zé Maria
Nascimento
e o nosso mocotó
no Matadouro?
E o César
Teixeira? E o cavalo da lua?
O Josias
Sobrinho, o Sérgio Habibe?
E o Chico
Maranhão com seus sabores?
E os
caranguejos? E as nossas dores?
Pois até o
Pardal era um herói
para aquele
“homem do braço de ouro”.
Os pintores,
os artistas, os escultores?
O Jesus
Santos, Nagy Lajos, Ambrósio Amorim?
Onde ficam
meus versos n isso tudo?
Entre as
saúvas,
ou presos nos
andaimes do céu
de algumas
boca?
Oitava
Estação
ENTRE OS
MERCADORES
Essa prisão de ouro me angustia
pois
prenuncia a dor que vem depois.
O amor de
pedra, os laços da agonia
que me
prendem e sufocam noite e dia.
Assim sendo,
me vou
com meu
calvário às costas:
um madeirame
que não chegou a cruz,
sem pregos ou
lágrimas divinas
que me
tornassem um filho de Jesus.
Um mau
discípulo, talvez.
Talvez um
cego, um tolo andando no escuro
e contra a
luz.
Oferecem-me
vinho, eu vou e bebo
até cair no
vaso ou na sarjeta.
Drogas
pesadas, pó,
o cigarrinho,
vício do capeta:
deixem
comigo, é tudo
de uma vez
só,
eu bebo e
brigo,
isso em
falso, grito
blasfêmias
que um Deus não ouvirá.
Dinheiro e
sangue
os novos
alimentos
que me mantêm
suspenso no varal,
qual roupa
mal lavada,
suja, sem
remendos
com manchas de suor
que destilo,
alambique humano.
“Vaso ruim
não quebra, mano,
tenha dó...”
São cifras do
inferno e profecias
que nunca se
cumpriram,
ou cumprirão,
meu estranho
destino aqui na terra.
Comprar e
vender. Trocar
miudezas por
palavras rudes.
Barganhar e
entregar
ervas e
quimeras
de um altar
já profanado
por lobos
avarentos e vorazes.
Perdulário no
amor e espião
de vidas que
se movem nos monturos,
catando pra
comer o lixo humano
que sobra
neste tráfico do mundo.
Ódio a si
mesmo
não é moeda
aceita,
nem despir-se
da pele do seu corpo
e atirá-la
aos cães mais furiosos
que se
conhece deste lado do planeta.
Tudo ilusão.
Tudo perda.
Tudo pó da
terra e sal marinho.
Nunca as aves
do céu voaram tanto.
Nunca os
insetos do chão,
ou mesmo
vermes,
que se
alimentam do plasma
e das
crianças
rastejaram
tanto vida afora.
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